segunda-feira, 28 de novembro de 2016
quinta-feira, 6 de outubro de 2016
quarta-feira, 5 de outubro de 2016
Nota de Pesar
Estávamos em 2008.
Os chineses não queriam aceitar o terreno disponibilizado para a construção do Palácio da Justiça. Diziam, e com razão, que era pequeno e não permitiria construções de posterior alargamento; que era muito baixo e desnivelado, logo iria precisar de muito aterro; que estava ao lado de um Banco e junto de um Hospital (o Militar) e não seria adequado construir um Palácio da Justiça nessas proximidades; ademais, acrescentavam, o ideal seria que o edifício do órgão judicial se enquadrasse nas proximidades do Palácio do Governo, cujas obras já se haviam iniciado.
Era domingo. Dirigi-me a uma zona junto ao QG, para importunar o descanso do PM, que se encontrava em convívio com os amigos. Anunciei-me e, em jeito de SOS, disse: «_Preciso de ver Abel Incada, é um assunto urgente. Preciso de um terreno dele, pois os chineses, a equipa técnica, chegam na 3.ª feira e tenho que ter uma resposta.» Poucos minutos depois, chegou Abel Incada. Homem altíssimo, comerciante, Conselheiro do PM e dono do terreno implorado. Numa situação um pouco caricata, a um canto e fora do convívio promovido pelo PM, Abel Incada ouviu atentamente a minha súplica: «É para o Estado e para a nossa Justiça! Não temos infra-estruturas!» Depois de praguejar um pouco, ficou pensativo e, mais para me acalmar, finalmente falou, de forma muito serena: «_É muita diferença. Tinha projectado construir um hotel nesse terreno. Mas deixa-me pensar, amanhã digo qualquer coisa.» Quase não dormi nessa noite.
Pouco passava das 9 da manhã quando Abel Incada me entra pelo Ministério adentro e me atira à queima-roupa:
- Fique com o terreno.
- Contrapartidas? – disparei, de forma igualmente curta e objectiva.
- Nenhuma. Permuta. Troca por troca, pelo terreno desprezado – respondeu.
Assim foi… Obrigada por mim e por todos nós.
Pudessem todos os políticos sentir o apelo do interesse público e nacional.
Descansa em paz, Abel Incada.
Carmelita Pires, ex-Ministra da Justiça e Presidente do PUSD
domingo, 25 de setembro de 2016
Setembro Vitorioso
De derrota em derrota, quando vemos o país eternamente adiado, como podemos cantar com a mesma alegria que em 1973 e 1974?
O que terá corrompido o nosso glorioso «Setembro Vitorioso»?
Muitas coisas…
Como por exemplo, a repetição dos mesmos erros, vezes sem conta. O povo começa agora a aperceber-se que não são simples «erros» mas antes todo um sistema, cujo objectivo é precisamente sujeitar a sociedade à mediocridade, à miséria, parasitando todas as instâncias de poder político, até ao esqueleto nacional de um NÃO ESTADO.
Como por exemplo, continuar na senda da INCLUSÃO GOVERNAMENTAL, expediente inaugurado no pós-guerra civil e que sempre acarretou maus resultados, apenas favorecendo um cliché para estrangeiro ver, e nunca o Estado ou a população.
Como por exemplo, alimentar a hipocrisia, FINGIR DIÁLOGO, quando este não existe.
Como por exemplo, manter o Estado refém de mecanismos de enriquecimento ilegítimo, elevando ao rubro os INTERESSES PARTICULARES e conservando na governação pessoas impreparadas, quer do ponto de vista da capacidade e da competência, quer da idoneidade e da moral, tudo isto apenas na base desses mesmos interesses. Dando assim péssimos exemplos de corrupção, ostentação e delapidação de fortunas do erário público, em proveito próprio.
Como por exemplo, na actual conjuntura do país e num crescendo de DEMAGOGIA POPULISTA, abusar da memória de Amílcar Cabral, quando o actual Partido, e os seus dirigentes, representam a perfeita antítese dos ideais por este defendidos.
Celebrar, comemorar e homenagear? Hoje? NÃO!
Porquê?
Estamos no séc. XXI e estamos num dos PAÍSES MAIS POBRES do mundo, apesar de uma fachada marítima incrivelmente fértil, tal como o são igualmente as terras de aluvião, logo além do tarrafe.
Mas a «Independência» reverteu-se na DEPENDÊNCIA POLÍTICA E ECONÓMICA: chegámos ao ponto de ver a CEDEAO, o Conselho de Segurança da ONU, os «parceiros de desenvolvimento», a cozinhar uma solução política; as instituições da Bretton Woods, a UEMOA e, uma vez mais, os «parceiros de desenvolvimento», a abanar com dinheiro (que, a seguirmos pelo mesmo caminho, se realmente esse dinheiro vier, logo se perderá pelos mesmos meandros); enquanto o Estado, continua a não possuir nem solução política nem, muito menos, qualquer visão económica, que dê consistência a uma política de crescimento e desenvolvimento sustentável.
O poder judicial continua reconhecidamente INOPERANTE E CADUCO, senão mesmo corrupto, conforme os diagnósticos elaborados ao longo do tempo no Ministério da Justiça (e a opinião do Presidente da República, publicamente partilhada), não apenas com Carmelita Pires como titular, mas também quando esta pasta esteve sob a tutela de Djaló Pires, contribuindo para uma percepção de ausência de imparcialidade e de impunidade.
Não havendo perspectivas para o Estado a curto prazo, no âmbito de uma gestão pontual, prevalecerá sempre tendencialmente a LUTA DESMEDIDA PELO PODER e pela sua manutenção, o nepotismo, a clientela, a falta de escrúpulos, o despesismo, a mediocridade, a inércia, a inveja, a não responsabilização, a péssima produtividade, entre mil outras coisas más, que estarão a reforçar a maldita sina que se parece ter apropriado deste nosso país.
Celebrar e comemorar, homenagear? Daqui a uns anos, talvez. Porquê?
Porque continuamos OPTIMISTAS E PRESERVERANTES. Quando?
Quando o Estado recuperar a sua CREDIBILIDADE e for institucionalmente reabilitado, dando passos significativos na consolidação do sistema de governação, no combate à corrupção e à impunidade.
Quando estiver definitivamente estabilizado o fornecimento normal da ELECTRICIDADE E DE ÁGUA.
Quando já não houver SALÁRIOS EM ATRASO e estes forem reajustados ao nível da sub-região.
Quando se encetar o PROGRAMA DE MODERNIZAÇÃO do sector de Defesa e Segurança.
Quando o COMBATE AO ANALFABETISMO registar sucessos significativos, e passarmos a desenvolver conteúdos culturais nacionais.
Quando os hospitais estiverem apetrechados com recursos humanos minimamente qualificados e com materiais e equipamentos indispensáveis para o seu funcionamento e a SALVAGUARDA DA VIDA humana, que para um tratamento simples não seja necessário ir a Dakar ou a Lisboa.
Quando os IDH (Índices de Desenvolvimento Humano) derem um bom pulo, teremos então um bom pretexto e uma boa razão para comemorar.
Até lá, não podemos falar em «VITÓRIA», pois assemelha-se mais a «VERGONHA».
Mas continuo a acreditar que muitos de nós, antes de morrer, ainda iremos, POR DIREITO PRÓPRIO, celebrar esse famoso «Setembro Vitorioso», que para já, não passa de uma miragem.
O que terá corrompido o nosso glorioso «Setembro Vitorioso»?
Muitas coisas…
Como por exemplo, a repetição dos mesmos erros, vezes sem conta. O povo começa agora a aperceber-se que não são simples «erros» mas antes todo um sistema, cujo objectivo é precisamente sujeitar a sociedade à mediocridade, à miséria, parasitando todas as instâncias de poder político, até ao esqueleto nacional de um NÃO ESTADO.
Como por exemplo, continuar na senda da INCLUSÃO GOVERNAMENTAL, expediente inaugurado no pós-guerra civil e que sempre acarretou maus resultados, apenas favorecendo um cliché para estrangeiro ver, e nunca o Estado ou a população.
Como por exemplo, alimentar a hipocrisia, FINGIR DIÁLOGO, quando este não existe.
Como por exemplo, manter o Estado refém de mecanismos de enriquecimento ilegítimo, elevando ao rubro os INTERESSES PARTICULARES e conservando na governação pessoas impreparadas, quer do ponto de vista da capacidade e da competência, quer da idoneidade e da moral, tudo isto apenas na base desses mesmos interesses. Dando assim péssimos exemplos de corrupção, ostentação e delapidação de fortunas do erário público, em proveito próprio.
Como por exemplo, na actual conjuntura do país e num crescendo de DEMAGOGIA POPULISTA, abusar da memória de Amílcar Cabral, quando o actual Partido, e os seus dirigentes, representam a perfeita antítese dos ideais por este defendidos.
Celebrar, comemorar e homenagear? Hoje? NÃO!
Porquê?
Estamos no séc. XXI e estamos num dos PAÍSES MAIS POBRES do mundo, apesar de uma fachada marítima incrivelmente fértil, tal como o são igualmente as terras de aluvião, logo além do tarrafe.
Mas a «Independência» reverteu-se na DEPENDÊNCIA POLÍTICA E ECONÓMICA: chegámos ao ponto de ver a CEDEAO, o Conselho de Segurança da ONU, os «parceiros de desenvolvimento», a cozinhar uma solução política; as instituições da Bretton Woods, a UEMOA e, uma vez mais, os «parceiros de desenvolvimento», a abanar com dinheiro (que, a seguirmos pelo mesmo caminho, se realmente esse dinheiro vier, logo se perderá pelos mesmos meandros); enquanto o Estado, continua a não possuir nem solução política nem, muito menos, qualquer visão económica, que dê consistência a uma política de crescimento e desenvolvimento sustentável.
O poder judicial continua reconhecidamente INOPERANTE E CADUCO, senão mesmo corrupto, conforme os diagnósticos elaborados ao longo do tempo no Ministério da Justiça (e a opinião do Presidente da República, publicamente partilhada), não apenas com Carmelita Pires como titular, mas também quando esta pasta esteve sob a tutela de Djaló Pires, contribuindo para uma percepção de ausência de imparcialidade e de impunidade.
Não havendo perspectivas para o Estado a curto prazo, no âmbito de uma gestão pontual, prevalecerá sempre tendencialmente a LUTA DESMEDIDA PELO PODER e pela sua manutenção, o nepotismo, a clientela, a falta de escrúpulos, o despesismo, a mediocridade, a inércia, a inveja, a não responsabilização, a péssima produtividade, entre mil outras coisas más, que estarão a reforçar a maldita sina que se parece ter apropriado deste nosso país.
Celebrar e comemorar, homenagear? Daqui a uns anos, talvez. Porquê?
Porque continuamos OPTIMISTAS E PRESERVERANTES. Quando?
Quando o Estado recuperar a sua CREDIBILIDADE e for institucionalmente reabilitado, dando passos significativos na consolidação do sistema de governação, no combate à corrupção e à impunidade.
Quando estiver definitivamente estabilizado o fornecimento normal da ELECTRICIDADE E DE ÁGUA.
Quando já não houver SALÁRIOS EM ATRASO e estes forem reajustados ao nível da sub-região.
Quando se encetar o PROGRAMA DE MODERNIZAÇÃO do sector de Defesa e Segurança.
Quando o COMBATE AO ANALFABETISMO registar sucessos significativos, e passarmos a desenvolver conteúdos culturais nacionais.
Quando os hospitais estiverem apetrechados com recursos humanos minimamente qualificados e com materiais e equipamentos indispensáveis para o seu funcionamento e a SALVAGUARDA DA VIDA humana, que para um tratamento simples não seja necessário ir a Dakar ou a Lisboa.
Quando os IDH (Índices de Desenvolvimento Humano) derem um bom pulo, teremos então um bom pretexto e uma boa razão para comemorar.
Até lá, não podemos falar em «VITÓRIA», pois assemelha-se mais a «VERGONHA».
Mas continuo a acreditar que muitos de nós, antes de morrer, ainda iremos, POR DIREITO PRÓPRIO, celebrar esse famoso «Setembro Vitorioso», que para já, não passa de uma miragem.
quinta-feira, 9 de junho de 2016
Datas Esquecidas
Já lá vão 18 anos desde o 7 de Junho de 1998.
Por causa da guerra e no ano da guerra, muitos despertámos para a política. Juntávamo-nos em Lisboa sob a senda da Justiça com J grande. Éramos muitos guineenses e amigos portugueses da Guiné-Bissau. Todos preocupados com o país. Em comprometimento patriota, reuníamos normalmente no Holiday Inn. Tínhamos reuniões diárias, ou quase. Até nos dávamos ao luxo de enviar textos à Junta em Abidjan. Tenho as fotos que ilustram os espíritos. Fazíamos conferências públicas. Infelizmente, outros já não estão entre nós: o saudoso Pepito e o Adriano!
Acabo de percorrer o interior do país «de lés a lés». Onde a população, aos meus olhos, está entregue à sua sorte e a viver, ou pior, sobrevivendo, em localidades onde o Estado mais não é do que uma miragem.
Os últimos dados estatísticos (INE, 2014) dizem que somos 365.097 em Bissau. No entanto, existem 1.149.354 de pessoas no interior do país.
A Guiné-Bissau é de DATAS ESQUECIDAS!
Estamos como estamos: aguardando os barricados, o governo empossado, os polícias, os juízes, os bloguistas, etc. etc. Sem mais! Enquanto a CI continua complacente, num país fortemente dependente da ajuda externa, porque lê e estuda a nossa história, as nossas pessoas e afinidades, os indivíduos e interesses, os factos e feitos recentes, observando-nos no agora. Nós que aguardamos que os da sub-região apareçam, de novo, para paternalmente nos ajudarem a caminhar na terra fértil e promissora que Amílcar Cabral ofereceu para nossos próprios pés.
O fatídico 7 de Junho, que dizimou almas cujo número, por este andar, nunca se saberá, pouco interessa à história política e sobretudo à recente. Tudo: «Pa i bai suma mon di sal na iagu!». Ademais, é matéria desagradável e imediatamente se torna censurável a pessoa que tenha a desfaçatez de trazer o assunto à colação.
Para que foi tudo isso? Para estarmos assim? Ou seja: instabilidade política crónica, taxa de analfabetismo de 49,8%, em que 69% da população vive com menos de 2 dólares, só 10% da população possui água canalizada, classificados no 177.º no lugar Índice de Desenvolvimento Humano e com a esperança de vida de 54 anos de idade.
Por isso resolvi partilhar o vídeo abaixo e os que seguem. Porque devemos reflectir no FUTURO COLECTIVO, nos nossos filhos e nossos netos.
A revolta dos mais velhos
Por causa da guerra e no ano da guerra, muitos despertámos para a política. Juntávamo-nos em Lisboa sob a senda da Justiça com J grande. Éramos muitos guineenses e amigos portugueses da Guiné-Bissau. Todos preocupados com o país. Em comprometimento patriota, reuníamos normalmente no Holiday Inn. Tínhamos reuniões diárias, ou quase. Até nos dávamos ao luxo de enviar textos à Junta em Abidjan. Tenho as fotos que ilustram os espíritos. Fazíamos conferências públicas. Infelizmente, outros já não estão entre nós: o saudoso Pepito e o Adriano!
Acabo de percorrer o interior do país «de lés a lés». Onde a população, aos meus olhos, está entregue à sua sorte e a viver, ou pior, sobrevivendo, em localidades onde o Estado mais não é do que uma miragem.
Os últimos dados estatísticos (INE, 2014) dizem que somos 365.097 em Bissau. No entanto, existem 1.149.354 de pessoas no interior do país.
A Guiné-Bissau é de DATAS ESQUECIDAS!
Estamos como estamos: aguardando os barricados, o governo empossado, os polícias, os juízes, os bloguistas, etc. etc. Sem mais! Enquanto a CI continua complacente, num país fortemente dependente da ajuda externa, porque lê e estuda a nossa história, as nossas pessoas e afinidades, os indivíduos e interesses, os factos e feitos recentes, observando-nos no agora. Nós que aguardamos que os da sub-região apareçam, de novo, para paternalmente nos ajudarem a caminhar na terra fértil e promissora que Amílcar Cabral ofereceu para nossos próprios pés.
O fatídico 7 de Junho, que dizimou almas cujo número, por este andar, nunca se saberá, pouco interessa à história política e sobretudo à recente. Tudo: «Pa i bai suma mon di sal na iagu!». Ademais, é matéria desagradável e imediatamente se torna censurável a pessoa que tenha a desfaçatez de trazer o assunto à colação.
Para que foi tudo isso? Para estarmos assim? Ou seja: instabilidade política crónica, taxa de analfabetismo de 49,8%, em que 69% da população vive com menos de 2 dólares, só 10% da população possui água canalizada, classificados no 177.º no lugar Índice de Desenvolvimento Humano e com a esperança de vida de 54 anos de idade.
Por isso resolvi partilhar o vídeo abaixo e os que seguem. Porque devemos reflectir no FUTURO COLECTIVO, nos nossos filhos e nossos netos.
A revolta dos mais velhos
Carmelita Pires
sábado, 28 de maio de 2016
Reserva moral: Precisa-se
Chove torrencialmente em Bissau. A primeira chuva entra pelo tecto do quarto e molha-me o colchão, mais uma vez. Mesmo assim, porque estamos acostumados, ouvindo o discurso do novo PM em acto de posse, reflicto…!
Tínhamos um PR, uma ANP e um PM, todos do PAIGC. Tudo CONSTITUCIONAL, LEGAL E SOBERANO: ‟Mon na Lama” e ‟Terra Ranka”!
Perante as evidências, contivemos a impaciência, perante mais uma guerra aberta, do salve-se quem "poder", porque, essa guerra, NÃO ERA A NOSSA.
Aqui e hoje, deixo claro que, sendo o PUSD partido sem representação parlamentar, recusamos deitar mais lenha na fogueira e manifestamos, nesta crise e a quem de direito, o nosso compromisso, voluntarismo e disponibilidade, para trabalhar numa SOLUÇÃO SUSTENTÁVEL E DURADOURA para a Guiné-Bissau, o nosso país. Algo claro e em jeito de PACTO NACIONAL.
Todavia, nas reviravoltas, nesta NOVA ÉPOCA, sabemos que toda a anterior história de INCLUSÃO E ESTABILIDADE começou a desmoronar-se com as denúncias públicas de actos de suspeição de corrupção/não transparência/impunidade, versus a luta pelo controlo do dito Estado e dos seus recursos. Este o CENÁRIO DÉMODÉ que, em tempos, nos levou a uma GUERRA CITADINA e ao qual, neste séc. XXI, se acrescenta: os interesses políticos, os financeiros, os partidários, os do sistema e do status quo, os dos clãs, os de parentesco, os de identidade étnica e religiosa e, ainda, os dos capangas contratados (Atenção: nem tudo o que parece é. Particularmente nas personagens deste Facebook, outras redes sociais e blogues). Temos assistido a isto, SEMPRE. Tudo versus o INTERESSE NACIONAL.
Entretanto, nesta DEMOCRACIA do hoje, saiu-nos o seguinte:
1) Um PR com ficha de indiciação criminal, limpa pelo PAIGC;
2) Um PR que publicamente indicia a existência corrupção ao alto nível e em dois poderes do Estado, o judicial e o governativo, com indiciação criminal e pública de membros do Governo, alguns com processos anteriormente pendentes;
3) A mistificação total do Estado: IRÃS E MOUROS (Perguntem-me!);
4) O pedido pelo Governo de DEBATE SOBRE A JUSTIÇA, imediatamente cancelado;
5) A demissão pelo PR do IX Governo Constitucional (argumento principal: CORRUPÇÃO);
6) A incessante GUERRA INTERNA NO PAIGC (a cúpula, o PR e suas alianças, os 15, os Combatentes da Liberdade da Pátria, e mais facções, nomeadamente de Cacheu) e a PGR como arma de arremesso;
7) Apesar de uma NOVA MAIORIA PARLAMENTAR, inviabilizaram os trabalhos na ANP, e agora barricam-se nos seus Gabinetes.
8) A JUDICIALIZAÇÃO DA VIDA POLÍTICA, com providências judiciais, sentenças e acórdãos;
9) Uma sintomática BIPOLARIZAÇÃO POLÍTICA, enquanto os mini-partidos, com representação ou sem representação, num Deus nos acuda de posicionamentos (alguns suspeitos) das suas ditas lideranças, para todos assistirmos e ouvirmos: ora com o PAIGC, ora com PR, ora com os 15 e ora com eles próprios – se atentos verificamos isso e, como sempre, sobra algo para eles nos habituais períodos de excepção constitucional e, naturalmente o RABA-RABATA;
10) A sociedade civil ‟independente”, no descalabro, a nadar nestas ondas de sobrevivência;
11) A adaptação informal da Constituição da República aos interesses partidários e em vozes sonantes, para dizer que o outro não cumpre e, então, não cumprirmos;
12) O desespero registável da 2.ª força partidária (Com que linhas tecer? Mindjor na és!);
13) Numa mesma legislatura, a nomeação do 3.º Vice do bendito PAIGC, de novo e em retorno, como o 4.º PM da legislatura, o tal expulso/não expulsado do seu partido, que dizem sem perfil, sem competência, sem capacidade e, claro, sem saber se conseguirá o necessário sustentáculo partidário (Veremos!).
Nesta sexta-feira, nas minhas reflexões, chego ao N.º 13 que pode ser AZAR (6.ª 13), mas há quem o veja como SORTE. Que seja bom presságio!
Bom, não obstante a tiragem da sorte, uma evidência do relato é que NESTAS COISAS NINGUÉM GANHA. Enganados estão os principais autores do puzzle, que têm filhos e talvez netos. QUEM PERDE É POVO E A GUINÉ-BISSAU: NÓS, a maioria, onde os tais amanhã estarão incluídos. NÓS que aguardamos, sem equipas de facto, levados ao ostracismo, alguns com sapiência e conhecedores das histórias. Pois, no prejuízo da crise, tudo vimos e sabemos. Só nos falta enterrar os vivos!
Questionamos: Quem nos acudirá? Já que somos incapazes, com provas dadas de incapacidade perante a comunidade internacional, a sub-região e os nossos parceiros, todos eles desalentados por NÓS.
Que exasperação perante a história e percurso recente deste PAIGC, que não deixa de ser NOSSO LIBERTADOR!
Com alguma propriedade (filha da Guiné) que aos outros e muitos também assiste, para os 36 mil e poucos km² e a nossa pouca população, lanço o CONCURSO REVOLUCIONÁRIO:
PRECISA-SE DE RESERVA MORAL: 13 patriotas, idóneos/as, com visão de desenvolvimento, conhecedores da nossa realidade, capazes e competentes na sua área, dispostos e disponíveis para se juntarem em prol do bem-comum, sem pejo pelo poder, que queiram trabalhar e muito para o bem comum, SACRIFICANDO-SE, contra o sistema e o status quo e nos termos do art.º 2, n.º 2 da Constituição da República (‟ O povo exerce o poder político DIRECTAMENTE ou através …”). O desafio: REFORMULAÇÃO DO ESTADO. Senão, vamos ter que SALDAR o nosso país!
E, para concluir, em DEMOCRACIA, que ninguém se atreva a dar mais um único tiro, qualquer que seja a razão, no TCHON DI CABRAL.
A Presidente,
Carmelita Pires
sábado, 21 de maio de 2016
Desmentido
Fernanda, uma militante do PUSD, alertou-nos para a utilização que está maliciosa e abusivamente a ser feita do nome do Partido, nas Rádios e outros meios de comunicação social, associando este ao PAIGC e a um grupo de outros partidos na sua órbita, no contexto da organização de manifestações contra o Presidente da República.
Vimos por este meio esclarecer que o PUSD é completamente alheio a estas convocações, que não foi contactado nem participou de quaisquer decisões nesse sentido, estranhando tais manobras e reservando-se o direito de agir em consequência contra os autores desta usurpação grave da nossa identidade jurídica colectiva.
Mais relembramos que o PUSD tem pautado o seu posicionamento pelo não alinhamento neste imbróglio político a que a irresponsabilidade do PAIGC tem conduzido o país. Uma postura de equidistância e de imparcialidade que não nos impede de registar a falta de respeito pelas regras de sã convivência democrática.
Recomendamos ainda aos guineenses para não se deixarem manipular por estas manobras de propaganda desonestas, que apenas servem para colocar a nu o desespero dos seus comanditários, face à sua manifesta falta de soluções e de capacidade para o diálogo, numa postura de bloqueio constitucional que pretendem imputar a outrem.
O PUSD, nesta crise política que assola o país, nunca deixou de se manifestar pelo diálogo, pela transparência, por uma solução governativa duradoura e sutentável. O PUSD defende Competência, Capacidade e Consistência; Ordem e Organização; Responsabilidade e Rigor; com estas regras, estará sempre disponível.
Contra a banalização da política!
Pela moralização da vida pública!
Contra a crispação parlamentar!
Pela pacificação social!
Vimos por este meio esclarecer que o PUSD é completamente alheio a estas convocações, que não foi contactado nem participou de quaisquer decisões nesse sentido, estranhando tais manobras e reservando-se o direito de agir em consequência contra os autores desta usurpação grave da nossa identidade jurídica colectiva.
Mais relembramos que o PUSD tem pautado o seu posicionamento pelo não alinhamento neste imbróglio político a que a irresponsabilidade do PAIGC tem conduzido o país. Uma postura de equidistância e de imparcialidade que não nos impede de registar a falta de respeito pelas regras de sã convivência democrática.
Recomendamos ainda aos guineenses para não se deixarem manipular por estas manobras de propaganda desonestas, que apenas servem para colocar a nu o desespero dos seus comanditários, face à sua manifesta falta de soluções e de capacidade para o diálogo, numa postura de bloqueio constitucional que pretendem imputar a outrem.
O PUSD, nesta crise política que assola o país, nunca deixou de se manifestar pelo diálogo, pela transparência, por uma solução governativa duradoura e sutentável. O PUSD defende Competência, Capacidade e Consistência; Ordem e Organização; Responsabilidade e Rigor; com estas regras, estará sempre disponível.
Contra a banalização da política!
Pela moralização da vida pública!
Contra a crispação parlamentar!
Pela pacificação social!
segunda-feira, 14 de março de 2016
O «Estado» da Mulher guineense
O PUSD comemorou o dia da Mulher com uma visita às mulheres horticultoras da Granja de Pessube, em Bissau. Nestes oito hectares de terra cedida pelo Estado cooperam formalmente, há quase um quarto de século, várias mulheres de etnia mancanha, na produção de alface, tomate, pimento, cenoura, feijão, repolho, couve, etc. Movidas por dificuldades em torno da situação familiar, sendo na maioria mães solteiras, com quatro a sete filhos cada uma, hoje com idades entre os quarentas e os setentas, souberam manter um colectivo unido e funcional, que gere a partilha da água e do veículo de transporte que possuem em comum para o seu serviço. A maioria depende quase exclusivamente dos rendimentos provenientes do seu trabalho na Granja, para além de uma importante fatia de autoconsumo, em torno de cerca de um quarto da produção, e ainda de uma outra parte solidariamente disponibilizada a título gracioso a amigos e amigas. Mesmo se muitas se queixam da falta de um retorno financeiro consistente, o facto é que graças ao seu trabalho e esforço, conseguiram não apenas cuidar da sua família, mas constituir-se como um importante pólo de solidariedade e de auto-abastecimento.
Sobre este país, onde a propriedade da terra continua a ser quase exclusivamente masculina, escrevia Ernst Schade, em 2005, durante a sua viagem ao interior do país: «São as mulheres que acarretam com os trabalhos mais pesados como, por exemplo, a extracção, tratamento e transporte do sal, uma actividade que implica grande esforço físico e quilómetros de estrada a percorrer, a pé. As horticultoras sacrificam-se para arrebanhar água para as hortas e as horas que elas passam no mercado para vender a colheita. São várias horas de labor. Chegadas a casa, cozinham e cuidam dos filhos». Questionando: «E os homens da Guiné? Parece que apenas deambulam, ocupados com negócios pouco claros, rezam e esperam pela tarde mais fresca. São as mulheres da Guiné-Bissau que mantêm o país a andar».
De que país estamos a falar? Podemos chamar-lhe país? Haverá um Estado na Guiné-Bissau?
Com uma cultura de matchundadi parasita, a classe política nacional tem vindo a dar provas de uma definitiva e inapelável incompetência. Estamos à porta do início da campanha do caju, e a incerteza prejudica ainda mais os termos de troca já de si muito desfavoráveis, em relação ao arroz. A esse facto vieram ultimamente juntar-se as dificuldades logísticas, as quais foram, pelo menos em parte, provocadas pelas irregularidades e arbitrariedades cometidas pelas autoridades governamentais, no porto de Bissau, ao sequestrarem propriedade privada, o que intimidou os empresários de importação e exportação, fazendo-os temer pela sua fazenda. Simultaneamente, a UEMOA, em plena expansão monetária (que não deixará de criar tensões inflacionistas na zona, o que permite antecipar uma desvalorização do câmbio ao euro) retrógrada a Guiné-Bissau para o último lugar na participação na emissão de dívida pública, estrangulando o país e abusando das suas riquezas a preço de saldo. Entretanto, a importantíssima negociação do acordo de gestão conjunta da área marítima comum com o Senegal, pode ser muito prejudicada pela actual fraqueza política gerada pela situação de desgovernação criada.
A mulher guineense está presente em todas as cenas da vida, fazendo mover o país. Dinamiza os negócios na e da família, ainda que a pequena escala. Existe protecção legal e não nos faltam as leis e os mecanismos, a nível da igualdade de género, tanto ao nível nacional, sub-regional, continental, como internacional. A Constituição da República, o Estatuto do pessoal da administração pública; a Lei geral de trabalho, a Lei-quadro dos partidos políticos e a Lei eleitoral; o Centro de Desenvolvimento do Género (CCDG) da CEDEAO; o Departamento de Promoção da Mulher da UEMOA, a Política de Género do CILSS; os programas regionais de estatísticas a favor da promoção da IEG dos PALOP; a Declaração de Salvador sobre à problemática de género e duas conferências e uma cimeira ao mais alto nível organizadas sobre o género pela CPLP; o Protocolo sobre os Direitos da Mulher, a Declaração Solene sobre a Igualdade entre os Homens e as Mulheres em África e o Fundo para as Mulheres Africanas (compromisso de dinamização da promoção da IEG no continente), todos da União Africana; e, na ONU, a ONU - Mulheres, a CEDEM/CEDAW (Convenção para a Eliminação de todas as Formas de Discriminação), a Declaração e Plataforma de Acção de Beijing, até as Resoluções 1325 (2000) e 1888 (2009) – criação de condições para que as mulheres sejam implicadas nos órgãos de decisão; etc., etc.
Mas e então?
A mulher guineense continua a ser discriminada a todos os níveis, desde o seu nascimento, até morrer; insere-se numa sociedade extremamente machista e perdida nas suas manifestações mitológicas e culturais com muitos séculos em atraso, extremamente vincada pela hierarquização dos sexos, onde prevalece a cultura de homem da casa ou homem grande e, na vida política, a cultura de matchundadi. Vive numa sociedade onde prevalecem a pobreza e as desigualdades, onde a poligamia estruturada floresce. Aqui a mulher pode ser herdada, não lhe sendo reconhecido qualquer direito de propriedade.
Nessas condições, que estará reservado à esmagadora maioria das mulheres, para além do papel de submissão, de silêncio, de condescendência, na origem da falta de auto-estima e falta de confiança em si e nas outras mulheres, continuando assim para reforçar o preconceito? Apesar de todas as leis e declarações de boas intenções, as mulheres não passam de uma em cada dez deputados no Parlamento, e de uma em vinte nas Forças Armadas, o que ilustra bem o reduzido papel político a que estão confinadas. Ademais, são vítimas de elevadíssimos níveis de violência interpessoal, física, psicológica, sexual, casamento forçado e mutilação genital feminina.
Perante este cenário, será possível concluir que a mulher participa na esfera da decisão?
A mulher guineense é sistematicamente dispensada das grandes decisões, normalmente relegada para segundo plano e sempre afastada, de forma mais ou menos subtil, dos centros de poder. A Guiné-Bissau assume-se, sem pudor, como não-Estado, violentando a condição feminina, pela inexistência de políticas estruturais de desenvolvimento direccionadas à promoção da igualdade do género e da própria mulher, que tenham em conta aspectos ligados ao poder económico e às oportunidades de valorização e promoção social. De retórica em retórica, vão-se transformando os direitos políticos, sociais e económicos das mulheres guineenses em meras miragens. A mulher guineense, principal vítima da instabilidade política crónica, é boa mãe, avó gentil, filha dedicada e esposa fiel; é condescendente, permissiva e mesmo sofredora, por vezes; é contra a violência e não é corrupta; é boa profissional, lutadora, decidida e voluntarista. Todas estas são qualidades que gostaríamos de valorizar na política, mas que decididamente escasseiam no actual meio político.
Voltando às mulheres horticultoras da Granja de Pessube… Nesse dia da Mulher, perante este impasse político, não sabendo se temos parlamento (ou quantos temos), se temos governo, ou programa e orçamento de Estado, e até se temos presidente, pareceu-nos importante destacar este exemplo prático, continuado e sustentável. Recebemos, durante a nossa visita, acompanhados pelas Rádios, um apelo pungente, um pedido de apoio, por parte destas mulheres. É que a bomba de água, que permite facilitar bastante a irrigação, se encontra avariada. As mulheres são unânimes em garantir que conseguiriam aumentar bastante a produção, caso conseguissem reunir as condições necessárias. E pedem uma coisa relativamente simples, como a manutenção do equipamento. São estas pequenas coisas, que produzem grandes efeitos, que deveriam ocupar a governação. Saber ouvir as pessoas, as suas preocupações, encontrar maneiras de resolver os problemas, mas também de premiar as experiências de sucesso, que também as há, que por cá vão surgindo. É igualmente irónico que as mulheres reclamem acesso a fertilizantes, sabendo que o nosso subsolo é rico em fostatos.
Segundo Amílcar Cabral, não basta «Defender os direitos da mulher, respeitar e fazer respeitar as mulheres, mas convencer as mulheres da nossa terra de que a sua libertação deve ser obra delas mesmas, pelo seu trabalho, … respeito próprio, personalidade e firmeza diante de tudo quanto possa ser contra a sua dignidade...» Neste contexto, como presidente do PUSD e como Mulher, considero que o actual cenário político é contra a minha dignidade patriótica. Nenhum país do mundo poderia viver meio ano de crise política. Só na Guiné, onde o Estado não existe e há muito que o povo sabe que não pode contar com ele.
Somos um país de gente maravilhosa e diversa, respeitadora e acolhedora, que não se reconhece neste triste circo a que vimos assistindo. São necessárias propostas assertivas, uma vontade férrea de mudança. Nós, mulheres, teríamos todo o gosto que os nossos homens fossem matchus. Mas verdadeiros e não só da boca para fora. Que se unissem e cooperassem em prol do bem comum; não que se esgotem em intermináveis e violentas lutas pelo poleiro, numa política da terra queimada. O discurso da virilidade inconsequente, uma governação inconsistente apenas dedicada a sonegar fundos públicos, numa indigna dependência do exterior, caracteriza o actual estado de coisas como de NÃO ESTADO. Como mulher, recuso-me a aceitar este estado de ansiedade e impotência, que julgo partilhar com todos e todas as guineenses.
Qual é o retrato do nosso país?
Com uma cultura de matchundadi parasita, a classe política nacional tem vindo a dar provas de uma definitiva e inapelável incompetência. Estamos à porta do início da campanha do caju, e a incerteza prejudica ainda mais os termos de troca já de si muito desfavoráveis, em relação ao arroz. A esse facto vieram ultimamente juntar-se as dificuldades logísticas, as quais foram, pelo menos em parte, provocadas pelas irregularidades e arbitrariedades cometidas pelas autoridades governamentais, no porto de Bissau, ao sequestrarem propriedade privada, o que intimidou os empresários de importação e exportação, fazendo-os temer pela sua fazenda. Simultaneamente, a UEMOA, em plena expansão monetária (que não deixará de criar tensões inflacionistas na zona, o que permite antecipar uma desvalorização do câmbio ao euro) retrógrada a Guiné-Bissau para o último lugar na participação na emissão de dívida pública, estrangulando o país e abusando das suas riquezas a preço de saldo. Entretanto, a importantíssima negociação do acordo de gestão conjunta da área marítima comum com o Senegal, pode ser muito prejudicada pela actual fraqueza política gerada pela situação de desgovernação criada.
A mulher guineense está presente em todas as cenas da vida, fazendo mover o país. Dinamiza os negócios na e da família, ainda que a pequena escala. Existe protecção legal e não nos faltam as leis e os mecanismos, a nível da igualdade de género, tanto ao nível nacional, sub-regional, continental, como internacional. A Constituição da República, o Estatuto do pessoal da administração pública; a Lei geral de trabalho, a Lei-quadro dos partidos políticos e a Lei eleitoral; o Centro de Desenvolvimento do Género (CCDG) da CEDEAO; o Departamento de Promoção da Mulher da UEMOA, a Política de Género do CILSS; os programas regionais de estatísticas a favor da promoção da IEG dos PALOP; a Declaração de Salvador sobre à problemática de género e duas conferências e uma cimeira ao mais alto nível organizadas sobre o género pela CPLP; o Protocolo sobre os Direitos da Mulher, a Declaração Solene sobre a Igualdade entre os Homens e as Mulheres em África e o Fundo para as Mulheres Africanas (compromisso de dinamização da promoção da IEG no continente), todos da União Africana; e, na ONU, a ONU - Mulheres, a CEDEM/CEDAW (Convenção para a Eliminação de todas as Formas de Discriminação), a Declaração e Plataforma de Acção de Beijing, até as Resoluções 1325 (2000) e 1888 (2009) – criação de condições para que as mulheres sejam implicadas nos órgãos de decisão; etc., etc.
Mas e então?
A mulher guineense continua a ser discriminada a todos os níveis, desde o seu nascimento, até morrer; insere-se numa sociedade extremamente machista e perdida nas suas manifestações mitológicas e culturais com muitos séculos em atraso, extremamente vincada pela hierarquização dos sexos, onde prevalece a cultura de homem da casa ou homem grande e, na vida política, a cultura de matchundadi. Vive numa sociedade onde prevalecem a pobreza e as desigualdades, onde a poligamia estruturada floresce. Aqui a mulher pode ser herdada, não lhe sendo reconhecido qualquer direito de propriedade.
Nessas condições, que estará reservado à esmagadora maioria das mulheres, para além do papel de submissão, de silêncio, de condescendência, na origem da falta de auto-estima e falta de confiança em si e nas outras mulheres, continuando assim para reforçar o preconceito? Apesar de todas as leis e declarações de boas intenções, as mulheres não passam de uma em cada dez deputados no Parlamento, e de uma em vinte nas Forças Armadas, o que ilustra bem o reduzido papel político a que estão confinadas. Ademais, são vítimas de elevadíssimos níveis de violência interpessoal, física, psicológica, sexual, casamento forçado e mutilação genital feminina.
Perante este cenário, será possível concluir que a mulher participa na esfera da decisão?
A mulher guineense é sistematicamente dispensada das grandes decisões, normalmente relegada para segundo plano e sempre afastada, de forma mais ou menos subtil, dos centros de poder. A Guiné-Bissau assume-se, sem pudor, como não-Estado, violentando a condição feminina, pela inexistência de políticas estruturais de desenvolvimento direccionadas à promoção da igualdade do género e da própria mulher, que tenham em conta aspectos ligados ao poder económico e às oportunidades de valorização e promoção social. De retórica em retórica, vão-se transformando os direitos políticos, sociais e económicos das mulheres guineenses em meras miragens. A mulher guineense, principal vítima da instabilidade política crónica, é boa mãe, avó gentil, filha dedicada e esposa fiel; é condescendente, permissiva e mesmo sofredora, por vezes; é contra a violência e não é corrupta; é boa profissional, lutadora, decidida e voluntarista. Todas estas são qualidades que gostaríamos de valorizar na política, mas que decididamente escasseiam no actual meio político.
Voltando às mulheres horticultoras da Granja de Pessube… Nesse dia da Mulher, perante este impasse político, não sabendo se temos parlamento (ou quantos temos), se temos governo, ou programa e orçamento de Estado, e até se temos presidente, pareceu-nos importante destacar este exemplo prático, continuado e sustentável. Recebemos, durante a nossa visita, acompanhados pelas Rádios, um apelo pungente, um pedido de apoio, por parte destas mulheres. É que a bomba de água, que permite facilitar bastante a irrigação, se encontra avariada. As mulheres são unânimes em garantir que conseguiriam aumentar bastante a produção, caso conseguissem reunir as condições necessárias. E pedem uma coisa relativamente simples, como a manutenção do equipamento. São estas pequenas coisas, que produzem grandes efeitos, que deveriam ocupar a governação. Saber ouvir as pessoas, as suas preocupações, encontrar maneiras de resolver os problemas, mas também de premiar as experiências de sucesso, que também as há, que por cá vão surgindo. É igualmente irónico que as mulheres reclamem acesso a fertilizantes, sabendo que o nosso subsolo é rico em fostatos.
Segundo Amílcar Cabral, não basta «Defender os direitos da mulher, respeitar e fazer respeitar as mulheres, mas convencer as mulheres da nossa terra de que a sua libertação deve ser obra delas mesmas, pelo seu trabalho, … respeito próprio, personalidade e firmeza diante de tudo quanto possa ser contra a sua dignidade...» Neste contexto, como presidente do PUSD e como Mulher, considero que o actual cenário político é contra a minha dignidade patriótica. Nenhum país do mundo poderia viver meio ano de crise política. Só na Guiné, onde o Estado não existe e há muito que o povo sabe que não pode contar com ele.
Somos um país de gente maravilhosa e diversa, respeitadora e acolhedora, que não se reconhece neste triste circo a que vimos assistindo. São necessárias propostas assertivas, uma vontade férrea de mudança. Nós, mulheres, teríamos todo o gosto que os nossos homens fossem matchus. Mas verdadeiros e não só da boca para fora. Que se unissem e cooperassem em prol do bem comum; não que se esgotem em intermináveis e violentas lutas pelo poleiro, numa política da terra queimada. O discurso da virilidade inconsequente, uma governação inconsistente apenas dedicada a sonegar fundos públicos, numa indigna dependência do exterior, caracteriza o actual estado de coisas como de NÃO ESTADO. Como mulher, recuso-me a aceitar este estado de ansiedade e impotência, que julgo partilhar com todos e todas as guineenses.
Qual é o retrato do nosso país?
As estimativas oficiais para 2010 colocam a pobreza moderada (US $2) perto de 70%, superior aos valores de 2002, quando havia sido estabelecida em 65%. A pobreza extrema (US $1) também está entre as mais altas do mundo, chegando a 33% em 2010, contra 21% em 2002. As oportunidades económicas para as famílias pobres são limitadas. Três em cada quatro famílias que vivem em extrema pobreza dependem quase exclusivamente da agricultura para o seu rendimento, consumo e troca. A maioria dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) estão fora do alcance para a Guiné-Bissau. Existem graves lacunas de infra-estrutura, particularmente em relação ao porto, electricidade e abastecimento de água. A economia é fortemente dependente de uma cultura - o caju - enquanto o arroz e o combustível são as principais importações, deixando o país vulnerável à flutuação de preços mundiais nestes três produtos. Se a factura energética tem sido aliviada pela queda acentuada do preço do petróleo, é inaceitável que o produtor nacional veja os seus termos de troca completamente distorcidos em seu desfavor, na troca entre castanha de caju e arroz. Esta situação tende a agravar-se com a forte diluição do peso da Guiné no seio da UEMOA, com uma participação insignificante no crescimento da massa monetária da sub-região.
Tudo isto é ainda mais lamentável sabendo como pequenos ganhos na melhoria das condições de habitação, saneamento, acesso à água potável e posse de bens duráveis podem resultar em mudanças significativas na incidência da pobreza.
Cá na Guiné-Bissau, uma em cada seis crianças morre antes dos cinco anos. Aqui, morrem oito mães por cada mil nascimentos. Entre 50 a 100 vezes pior que as mesmas taxas em Portugal. Ou seja, a nossa «performance» é lamentável, posicionando o país na cauda de todos os índices de desenvolvimento… Cerca de um quarto das famílias levam entre 15 minutos e uma hora para ter acesso a água potável. Cerca de um quarto dos alunos/as percorrem mais de uma hora para chegar à sua escola. A taxa de alfabetização das mulheres de 15 a 24 anos é de 40% (cerca de uma em cada duas, na capital, mas menos de uma em cada dez, nas regiões rurais), muito inferior à dos rapazes. O que resulta numa manutenção estrutural do analfabetismo acima de metade da população, com especial incidência na mulher. Muitas vezes, é a falta de acesso a água potável e as distâncias que é preciso percorrer, que pressionam sobretudo as raparigas e as mulheres. Coisas simples, como o acesso à água, uma fonte, podem fazer uma grande diferença.
Portanto, se as condições se reproduzem, se a mulher assume a prole (muitas vezes precocemente), e a responsabilidade de garantir água e comida à família; e as raparigas não vão à escola; como esperar melhorias significativas na condição da mulher?
Certamente que não será com o PAIGC, que precisa de fazer um longo estágio de oposição.
Carmelita Pires
sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016
Bô pára djá!
Nas vossas alas, inauguraram os GOLPES DE ESTADO, em Novembro de 1980, exterminando o projecto de Cabral.
Nas vossas alas, forjaram implicações no TRÁFICO DE ARMAS, cujo relatório da ANP até hoje não viu a luz do dia, o que nos trouxe a guerra civil, em plena capital, para que nada de lá saísse e ninguém fosse responsabilizado.
Nas vossas alas, desprestigiaram-nos com o rótulo de NARCO-ESTADO, para que nada de lá saísse e ninguém fosse responsabilizado.
Nas vossas alas, enlutaram famílias, outras que nem corpos viram, para que nada de lá saísse e ninguém fosse responsabilizado.
Nas vossas alas, geriram mais uma transição, fazendo-vos traídos, para ganhar-nos de novo e voltar a ser poder, para que nada de lá saísse e ninguém fosse responsabilizado.
Das vossas alas, propuseram-nos o Presidente da República, o Superior da ANP e o Chefe do Governo; mas, com os habituais jogos de intriga e de poder, nas vossas alas, deram o dito por não dito, para que nada de lá saísse e ninguém fosse responsabilizado.
Das vossas alas, vendem-nos de bandeja o misticismo, o paganismo, o medo do desconhecido, o pavor do pós-PAIGC, o fatalismo nacional, para que nada de lá saia e ninguém seja responsabilizado.
Das vossas alas, ditam a mesma cartilha de sempre: clientelismo, nepotismo, corrupção, ditadura, «Abaixo o PR», «Perda de Mandato», «Novas Eleições Gerais», etc., etc., para que nada de lá saia e ninguém seja responsabilizado.
Nas vossas alas, de cada vez que obrigam NOVO MEDIADOR estrangeiro a descer em solo pátrio, qualquer que seja o seu nível, vendem insistentemente a nossa honra, saldam a nossa bandeira e a memória de Amílcar Cabral, nada de lá saindo e ninguém se responsabilizando.
Até quando iremos permitir que, nas vossas alas, continuem a destratar o nosso destino comum, enquanto povo e nação, para que nada de lá saia e ninguém seja responsabilizado?
Até quando iremos consentir que, nas vossas alas, nos mantenham na CAUDA DO MUNDO, para que nada de lá saia e ninguém seja responsabilizado?
Tudo o que acontece na Guiné-Bissau continuará a acontecer, enquanto não houver uma MAIORIA que adquira clara CONSCIÊNCIA dos repetidos actos LESA PÁTRIA do PAIGC, que embrutecem injustamente o povo guineense aos olhos de uma comunidade internacional manifestamente cansada.
quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016
UEMOA baixa «nota» da Guiné-Bissau para menos de metade
A Agência Ecofin acaba de publicar os montantes de emissão de dívida para 2016, dos oito países que integram a UEMOA.
Metade dos países aumentam a sua dotação (a verde na tabela) e outra metade diminui (a vermelho), em relação a 2015. O Senegal, por exemplo, aumenta as suas disponibilidades em 200 mil milhões de CFA, de 490 para 690, a que se devem somar mais 150 mil milhões de um sukuk (obrigações religiosas).
O Mali, que o ano passado recebera uma dotação extraordinária, baixa um pouco, mas mantendo-se muito acima dos níveis históricos. Quem recebe este ano um grande incremento na dotação é o Burkina Faso, que duplica a sua emissão.
No entanto, a apresentação destes números em valores absolutos pouco nos diz em termos comparativos, pois a dimensão humana é bastante diversa. Por essa razão, apresentamos um gráfico com essa evolução de 2015 para 2016, mas em relação com as respectivas populações, em CFA per capita. Neste gráfico pode constatar-se o salto para a frente dado pelo Burkina Faso na União Monetária, abandonando o grupo dos mais desfavorecidos.
Note-se que os países que tradicionalmente eram considerados mais pobres correspondiam àqueles interiores e secos, com pouca ou nenhuma fachada marítima. Compreende-se que por vezes se favoreça um ou outro país por razões conjunturais de oportunidade política.
Choca-nos constatar que, ao arrepio das declarações sonantes de alguns responsáveis do Governo demitido, a realidade, traduzida em números oficiais e irrefutáveis, é que a Guiné-Bissau vai receber bem menos de metade daquilo que recebeu no ano passado, naquela que é a maior quebra registada, passando para último lugar da UEMOA, apesar da sua enorme (à sua escala) fachada marítima e grande abundância de água. Em termos per capita, valemos este ano cerca de sete vezes menos que um senegalês e um quarto de cada burkinabê, com um peso monetário de menos de 7000CFA por habitante.
Aqui se gera muito mais riqueza transaccionável do que no Niger, Mali ou Burkina Faso, sem desprestígio para com esses países e pelo seu esforço de luta contra a desertificação. A Guiné-Bissau é um exportador líquido que gera divisas, e os seus produtores são muito prejudicados nos termos de troca, pois chegam a receber apenas um quilo de arroz por cada quilo de castanha de caju.
Ou seja, a Guiné exporta um bem altamente apreciado (que, por exemplo o Governo goês, na Índia, paga a 100 rupias, 850 CFA, ao produtor, o equivalente a quatro quilos de arroz), recebendo em troca um bem importado a granel, beneficiando os países que mais dívida emitem (que passam a possuir assim um maior poder de aquisição).
Afinal, a montanha pariu um rato, o apregoado «milagre económico» parece não passar de uma ilusão e aqueles que, contra todas as evidências, continuam a reclamar que são Governo, parecem ter gasto todas as suas energias neste desgastante impasse. Não há uma comunicação ao país, uma explicação para este Estado de coisas? Um palavra oficial de desagrado? Uma posição pública?
Há que repensar seriamente o interesse nacional, no seio da União Monetária. O papel real da Guiné-Bissau tem vindo a ser cada vez mais depreciado, sem que vejamos quem se levante e indigne oficialmente perante esta situação altamente nociva, traduzindo o deserto de liderança e uma gritante ausência de visão estratégica de gente agarrada ao poder pelo poder. Essa quebra de quase 60% no nível de disponibilidades monetárias atribuídas ao nosso país, deve-se a quê?
O momento é de grandes decisões, e por isso deverá ser submetido à apreciação pública o relatório de avaliação da Agência de Gestão da Cooperação (AGC) referente às últimas duas décadas, para efeitos da renegociação do protocolo que deverá ocorrer ainda este ano. Não se compreende, aliás, que a gestão dessa Agência de Cooperação bilateral (Guiné-Bissau / Senegal) não seja completamente transparente, ou que se dote de uma ferramenta de comunicação, apresentando anualmente, no mínimo, relatórios contabilísticos de gestão do património partilhado.
É urgente que o país ofereça uma nova imagem, de governabilidade, para enfrentar com credibilidade estas ameaças à nossa soberania económica, testando a nossa capacidade política. E a melhor forma que temos, é fazer o trabalho de casa, o diálogo, a inclusividade, a transparência, a esperança, a confiança mútua.
Precisamente aquilo que alguns se obstinam em descartar e subverter, tomando o nosso futuro colectivo por sua propriedade privada. São necessárias pessoas competentes e consistentes, que, com responsabilidade e rigor, se empenhem em ordenar, em organizar, oferecendo soluções sustentáveis e duradouras.
quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016
Nulidade contagiosa
Quando a consequente nulidade de uma decisão ilegal contamina e vicia todos os actos políticos subsequentes, é preciso, em consciência, saber dizer BASTA!
Não faz sentido, declarar ilegal o acto (decisão de perda de mandato), sem fazer o processo da recorrente má-fé que o envolveu, ou seja: para além de o acto ser ilegal em si, foi preparado recorrendo a mais ilegalidades (convocação ilegal da Comissão Permanente da ANP, aliás incompetente para tal, em termos regimentais).
O ex-presidente da mesa da ANP, consumou um Golpe palaciano, ao recorrer a sinuosos subterfúgios para subverter a seu favor a contagem de deputados, como forma de evitar perder o poder, sabendo que, se os 15 aceitassem passivamente essa decisão ilegal (perda de mandato), o processo se arrastaria nos tribunais, perderia actualidade e acabaria por não dar em nada. Como tem sido práxis no nosso país. As pessoas fartaram-se de assistir passivamente à subversão das regras mais elementares.
O jogo político deve manter-se na arena adequada, no respeito pelo espírito do articulado nas leis.
Não faz igualmente sentido condenar o gesto de irritação eminentemente político, ou Contra-Golpe, efectuado no estrito cumprimento formal da Lei, que resultou na alteração da composição da Mesa da ANP. Essa atitude assertiva ocorre após uma longa série de ilegalidades, inserindo-se num contexto político que não pode ser escamoteado. Vem-se praticando uma política do facto consumado, remetendo para os ofendidos o ónus do recurso aos Tribunais, conhecendo a realidade da Justiça no nosso país.
Segundo a Constituição da República, a ANP é a fonte de soberania, o seu Plenário é soberano, e a Justiça (à qual se reconhecem os vícios) incompetente para se imiscuir no seu funcionamento político.
O segundo acto sujeito ao erudito escrutínio dos constitucionalistas (um foi meu professor e outro meu orientador), consiste numa resposta política ao primeiro acto, pelos meios e no fórum adequado.
Por cá andamos há mais de quarenta anos a ser enganados com recurso a intrigas, cabalas e inventonas, sem que sejamos tidos nem achados, sujeitos/as ao rótulo fácil do «se não estás comigo estás contra mim».
O povo está farto. As máscaras vão caindo. Os aspirantes a ditador revelam-se.
O País tem de ser construído no diálogo e no respeito.
É necessário um Pacto de Regime. É urgente um Governo de Salvação Nacional.
A Guiné-Bissau só poderá dar o salto com uma solução sustentável e duradoura.
Carmelita Pires
domingo, 31 de janeiro de 2016
Titina, Titina Silá!
Hoje foi um dia de homenagens a TITINA SILÁ, figura lendária que povoou o meu imaginário juvenil, como figura de proa, ao lado de Cabral, na Luta de Libertação Nacional. Todas e todos da minha geração conhecem a história oficial, que até mereceu uma canção que me chega à memória. Essa identificação positiva levou-me a interessar pelo caso do seu assassinato.
Depois de ter deixado a Nigéria, com tempo, iniciei esta investigação e solicitei vários apoios nesse sentido.
O ilustre historiador guineense e actual Director do INEP, no seu livro Guerra Colonial & Guerra de Libertação, referindo-se a uma nota consultada nos arquivos da ex-PIDE-DGS e a um informe do PAIGC (aliás, coincidentes) resume assim a ocorrência:
«No dia 31 de Janeiro de 1973, uma vedeta da Marinha portuguesa tinha interceptado uma canoa do PAIGC que atravessava o rio Cacheu, em Tancroal, onde estavam dois médicos cubanos, Ernestina Silá (Titina Silá), Dick Daring e mais dois guerrilheiros que iam a caminho de Conakry para assistir às cerimónias fúnebres de Amílcar Cabral. Todos os elementos tripulantes da canoa caíram à água e fugiram debaixo do fogo, à excepção de Ernestina, que não sabia nadar, e ficou agarrada a um pau, tendo morrido ao ser atingida por uma bala.»
Como podem reparar, há uma primeira nota dissonante em relação à data, um dia depois da data oficial.
Tive a curiosidade de conhecer a versão da tropa portuguesa, e, tratando-se de um caso envolvendo a Marinha, inquiri o ARQUIVO HISTÓRICO DA MARINHA acerca de acções militares, envolvendo «contacto com o IN» (inimigo, na nomenclatura utilizada), nessa data e sector. Encontrei referência ao acontecido no Fundo/Núcleo 236A = Comando de Defesa Marítima da Guiné, em duas pastas separadas, uma referente ao DFE8 (Destacamento Fuzileiros Especiais N.º8), com a quota 4-XVIII-9-4; e a outra referente à LFG (Lancha de Fiscalização Grande) Sagitário, com a quota 4-XVIII-7-5, embora ainda sejam classificadas de «Confidencial», pois estas últimas encontram-se ainda dependentes de autorização superior, para consulta e reprodução.
Segundo o relatório da «OPERAÇÃO SALISBÚRIA» (acerca da qual não consegui apurar mais pormenores ou referências), um grupo táctico de duas parelhas de botes de borracha com fuzileiros do DFE8 que subiam o rio Cacheu, quando, cerca das 16h30, do dia 31 de Janeiro, avistaram um bote de borracha, cujos tripulantes se atiraram à água. Enquanto isso acontecia, os botes portugueses eram flagelados por fogo do PAIGC com origem na margem sul. Depois de os fuzileiros ripostarem e de terem recolhido o bote de borracha (que verificaram ser de fabrico russo e que abandonariam depois no local) e desembarcado na clareira do Jagali, chegou a LFG Sagitário (cerca das 16h50) que bateu a tiro ambas as margens. Como começava a anoitecer e os fuzileiros se encontravam já com poucas munições, reembarcaram todos na LFG Sagitário.
Segundo o mesmo relatório, os fuzileiros regressaram ao local no dia seguinte, dia 1 de Fevereiro, em «patrulhamento ofensivo», no sentido de tentar perceber melhor o ocorrido. Mas o que encontraram ainda os deixou mais confundidos. O chão apresentava vestígios da passagem de muita gente durante a noite, com muitas pegadas, encontrando-se todo espezinhado. Além disso, encontraram abandonada uma canoa em perfeito estado.
O comandante do DFE8, Ferreira da Silva, também se interessou pela questão e publicou em 2010 um artigo, no blog Luís Graça & Camaradas da Guiné, no qual referenciava o seguinte: «Se a morte de Titina Salá se verificou realmente no dia 30 de Janeiro numa acção dos fuzileiros isso só poderia ter acontecido num disparo sobre qualquer movimento suspeito na margem, acções essas que, por serem muito frequentes, não eram registadas.»
Ora, Titina era a responsável pela canoa, e decerto saberia como proteger-se desse género de ameaça.
Há demasiadas contradições em toda esta história.
Na canção e na visão romântica, temos um barco de guerra que lança bombas contra uma canoa. No entanto, na realidade, tudo se passou entre botes de borracha (o barco de guerra só chegou depois) e a canoa, essa, parece lá ter sido posta muito depois...!
Julgo eu que Amílcar Cabral adorava especialmente Titina, entre tantas guerrilheiras e funcionárias do Partido, porque via nela o espírito crítico, a capacidade para pensar com a sua própria cabeça. Que aconteceria se Titina chegasse a Conacri? Certamente iria fazer perguntas indiscretas, iria tentar investigar, para perceber toda a trama que esteve por detrás da morte de Cabral (que ele próprio, aliás, não desconhecia).
Foram criadas as condições para que matassem Amílcar Cabral, aproveitando a inveja e manipulando a insatisfação, sabendo que os executores seriam rapidamente imolados como bodes expiatórios do acto, para apagar as pistas.
Hoje, estudando, lendo e aprendendo, descobrimos que, na história que nos venderam, o que não se aceita é que tenham transformado Cabral num mito romântico, depois de ter sido traído e fuzilado em casa: das vítimas fizeram mártires e campeãs de mitos «mobilizadores», dos quais continuam a abusar passadas mais de quatro décadas de adulteração da sua herança espiritual, praticando uma política deliberada de erradicação do espírito crítico, que nos arrastou até à presente situação.
O recente artigo do Doutor Camais Blinque, de Tite, falando de um caso que também não conhecia (eventualmente por ter sido apagado da história oficial), de um valente comandante do PAIGC Kwad Nandami, conhecido pelo seu pragmatismo, que nos conta que foi morto na mesma altura, parece-me reforçar a necessidade de um esforço historiográfico mais fidedigno, antes que morram as últimas testemunhas.
Terá sido a 30 ou a 31? Nesta teia de contradições, optei por publicar este artigo, que comecei ontem, nesta madrugada do dia 31.
Deixemo-nos de encenações e mantenhamos a unidade em torno dos símbolos nacionais, sem oportunismo político!
Viva Titina Silá!
Vivas às mulheres guineenses.
Que Deus abençoe a República da Guiné-Bissau.
Carmelita Pires
Depois de ter deixado a Nigéria, com tempo, iniciei esta investigação e solicitei vários apoios nesse sentido.
O ilustre historiador guineense e actual Director do INEP, no seu livro Guerra Colonial & Guerra de Libertação, referindo-se a uma nota consultada nos arquivos da ex-PIDE-DGS e a um informe do PAIGC (aliás, coincidentes) resume assim a ocorrência:
«No dia 31 de Janeiro de 1973, uma vedeta da Marinha portuguesa tinha interceptado uma canoa do PAIGC que atravessava o rio Cacheu, em Tancroal, onde estavam dois médicos cubanos, Ernestina Silá (Titina Silá), Dick Daring e mais dois guerrilheiros que iam a caminho de Conakry para assistir às cerimónias fúnebres de Amílcar Cabral. Todos os elementos tripulantes da canoa caíram à água e fugiram debaixo do fogo, à excepção de Ernestina, que não sabia nadar, e ficou agarrada a um pau, tendo morrido ao ser atingida por uma bala.»
Como podem reparar, há uma primeira nota dissonante em relação à data, um dia depois da data oficial.
Tive a curiosidade de conhecer a versão da tropa portuguesa, e, tratando-se de um caso envolvendo a Marinha, inquiri o ARQUIVO HISTÓRICO DA MARINHA acerca de acções militares, envolvendo «contacto com o IN» (inimigo, na nomenclatura utilizada), nessa data e sector. Encontrei referência ao acontecido no Fundo/Núcleo 236A = Comando de Defesa Marítima da Guiné, em duas pastas separadas, uma referente ao DFE8 (Destacamento Fuzileiros Especiais N.º8), com a quota 4-XVIII-9-4; e a outra referente à LFG (Lancha de Fiscalização Grande) Sagitário, com a quota 4-XVIII-7-5, embora ainda sejam classificadas de «Confidencial», pois estas últimas encontram-se ainda dependentes de autorização superior, para consulta e reprodução.
Segundo o relatório da «OPERAÇÃO SALISBÚRIA» (acerca da qual não consegui apurar mais pormenores ou referências), um grupo táctico de duas parelhas de botes de borracha com fuzileiros do DFE8 que subiam o rio Cacheu, quando, cerca das 16h30, do dia 31 de Janeiro, avistaram um bote de borracha, cujos tripulantes se atiraram à água. Enquanto isso acontecia, os botes portugueses eram flagelados por fogo do PAIGC com origem na margem sul. Depois de os fuzileiros ripostarem e de terem recolhido o bote de borracha (que verificaram ser de fabrico russo e que abandonariam depois no local) e desembarcado na clareira do Jagali, chegou a LFG Sagitário (cerca das 16h50) que bateu a tiro ambas as margens. Como começava a anoitecer e os fuzileiros se encontravam já com poucas munições, reembarcaram todos na LFG Sagitário.
Segundo o mesmo relatório, os fuzileiros regressaram ao local no dia seguinte, dia 1 de Fevereiro, em «patrulhamento ofensivo», no sentido de tentar perceber melhor o ocorrido. Mas o que encontraram ainda os deixou mais confundidos. O chão apresentava vestígios da passagem de muita gente durante a noite, com muitas pegadas, encontrando-se todo espezinhado. Além disso, encontraram abandonada uma canoa em perfeito estado.
O comandante do DFE8, Ferreira da Silva, também se interessou pela questão e publicou em 2010 um artigo, no blog Luís Graça & Camaradas da Guiné, no qual referenciava o seguinte: «Se a morte de Titina Salá se verificou realmente no dia 30 de Janeiro numa acção dos fuzileiros isso só poderia ter acontecido num disparo sobre qualquer movimento suspeito na margem, acções essas que, por serem muito frequentes, não eram registadas.»
Ora, Titina era a responsável pela canoa, e decerto saberia como proteger-se desse género de ameaça.
Há demasiadas contradições em toda esta história.
Na canção e na visão romântica, temos um barco de guerra que lança bombas contra uma canoa. No entanto, na realidade, tudo se passou entre botes de borracha (o barco de guerra só chegou depois) e a canoa, essa, parece lá ter sido posta muito depois...!
Julgo eu que Amílcar Cabral adorava especialmente Titina, entre tantas guerrilheiras e funcionárias do Partido, porque via nela o espírito crítico, a capacidade para pensar com a sua própria cabeça. Que aconteceria se Titina chegasse a Conacri? Certamente iria fazer perguntas indiscretas, iria tentar investigar, para perceber toda a trama que esteve por detrás da morte de Cabral (que ele próprio, aliás, não desconhecia).
Foram criadas as condições para que matassem Amílcar Cabral, aproveitando a inveja e manipulando a insatisfação, sabendo que os executores seriam rapidamente imolados como bodes expiatórios do acto, para apagar as pistas.
Hoje, estudando, lendo e aprendendo, descobrimos que, na história que nos venderam, o que não se aceita é que tenham transformado Cabral num mito romântico, depois de ter sido traído e fuzilado em casa: das vítimas fizeram mártires e campeãs de mitos «mobilizadores», dos quais continuam a abusar passadas mais de quatro décadas de adulteração da sua herança espiritual, praticando uma política deliberada de erradicação do espírito crítico, que nos arrastou até à presente situação.
O recente artigo do Doutor Camais Blinque, de Tite, falando de um caso que também não conhecia (eventualmente por ter sido apagado da história oficial), de um valente comandante do PAIGC Kwad Nandami, conhecido pelo seu pragmatismo, que nos conta que foi morto na mesma altura, parece-me reforçar a necessidade de um esforço historiográfico mais fidedigno, antes que morram as últimas testemunhas.
Terá sido a 30 ou a 31? Nesta teia de contradições, optei por publicar este artigo, que comecei ontem, nesta madrugada do dia 31.
Deixemo-nos de encenações e mantenhamos a unidade em torno dos símbolos nacionais, sem oportunismo político!
Viva Titina Silá!
Vivas às mulheres guineenses.
Que Deus abençoe a República da Guiné-Bissau.
Carmelita Pires
segunda-feira, 25 de janeiro de 2016
Arquivo áudio
Inauguramos hoje mais uma «prateleira» na barra lateral direita, cantinho destinado a partilhar os ficheiros áudio das entrevistas às rádios, da Presidente do Partido, Carmelita Pires, por ocasião da presente crise política. Começamos pela entrevista concedida à Rádio Nossa no dia 23 de Janeiro, que poderá ouvir seguindo a ligação disponibilizada. Em breve partilharemos a entrevista concedida à Rádio Pidjiguiti, também anteontem, Sábado, bem como uma outra um pouco mais antiga.
Nota: poderá ter de transferir o ficheiro (37M) para conseguir ouvir.
Nota: poderá ter de transferir o ficheiro (37M) para conseguir ouvir.
sábado, 23 de janeiro de 2016
Basta!
Entrevista ao Jornal A Bola
Havendo necessidade de um esclarecimento sobre a atual situação política, ainda antes de darmos início à nossa argumentação jurídica e análise constitucional, façamos um pequeno resumo de como chegámos a esta situação caótica, de desregulação institucional e de subversão dos mais elementares princípios do Direito ou mesmo do simples bom senso.
Tudo gira em torno daquilo que se passou no dia 18 de Janeiro na Assembleia Nacional Popular (ANP), que passo a tentar resumir: estava reunido o plenário, tendo por ordem de trabalho a «segunda volta» do Programa que deveria ditar o futuro do Governo, que se encontrava presente, estando assim reunidas todas as condições requeridas.
O ex-presidente da ANP transportava um pesado fardo de abuso de autoridade num passado recente, de desrespeito pelo plenário, pelos prazos constitucionais, pelas ordens de trabalho e, em última análise, pelos deputados e deputadas da Nação nominalmente eleitos, na expectativa sempre frustrada de conseguir reunir uma maioria favorável aos seus intentos.
Ao verificar que o Comissário da Polícia da Ordem Pública (POP), José António Marques, cumprira os procedimentos legais, baseando-se no Boletim Oficial, e o resultado seria de novo desfavorável, pela enésima vez, Cipriano Cassamá anunciou a suspensão invocando «falta de condições de segurança». No entanto, nunca a segurança fora tão forte, como nesse último dia do Governo de Carlos Correia, em que até o ex-Primeiro-Ministro foi revistado, para entrar no hemiciclo.
Ora as reuniões da plenária só podem ser interrompidas nos termos do art.º 69.º do Regimento da ANP.
Quanto aos argumentos jurídicos, em defesa da legitimidade do novo Presidente da Mesa da ANP, Alberto Nambeia, julgo que foi sobre os artigos 23.º e 24.º do Regimento, que incidiram as principais críticas, pelo que quero começar precisamente por aí. O Artigo 23.º fala-nos sobre o Mandato do Presidente da ANP. O legislador traduz a configuração assumida pelo Parlamento, pelo que, no caso de alterações substanciais na maioria, é lícito que esta maioria, em democracia, assuma esse mandato em consonância, em nome do povo.
E o Artigo 24.º prevê a Substituição do Presidente da ANP. O ex-presidente deu FALTA DE COMPARÊNCIA (pois a sessão parlamentar fora suspensa e não encerrada, como o próprio defendeu posteriormente), e viu-se IMPEDIDO de continuar, embora estivesse presente nas instalações da ANP.
O ex-presidente da ANP reuniu assim cumulativamente as condições de faltoso e de impedido. Verificando-se o QUÓRUM (art.º 60.º do Regimento) suficiente para permitir deliberar. Em consequência, nos termos constitucionais e regimentares, o colectivo parlamentar validou o segundo Vice-Presidente, conforme estipulado no primeiro ponto desse artigo 24.º, para dar provimento à substituição do ex-Presidente, considerado indigno para o exercício do cargo, após recorrentes e grosseiras violações do Regimento e do respeito devido à dignidade da instituição.
Em síntese, o PAIGC praticou uma série de atropelos e deslealdades, recorrendo à sua máquina de manipulação, protelando indefinidamente qualquer solução que lhe fosse desfavorável, abusando dos mais absurdos subterfúgios legais para subverter Constituição e regras regimentais da ANP.
Perante a sucessão de inúmeros pequenos golpes na legalidade, a paciência esgotou-se. A Assembleia Nacional Popular é o órgão competente por excelência para dirimir esta alegada crise, como recentemente se resolveu em Portugal, porque tem mecanismos próprios à luz do Regimento e da Constituição da República, porque se deve evitar a judicialização dos atos políticos. Os problemas políticos devem ser resolvidos politicamente.
O Governo de Carlos Correia caiu no momento em que abandonou o Parlamento e cabe agora ao Presidente da República convidar o PRS para propor uma solução política.
O ex-Governo não tem condições políticas para continuar a reunir em Conselho de Ministros, ou sequer a invocar a qualidade de governantes. Entre os casos feridos de ilegitimidade, está a exoneração apressada e arbitrária, na Segunda-Feira passada, do Comissário da POP, a qual deve ser, para todos os efeitos, considerada nula e inexistente.
Quanto aos deputados do PAIGC, deverão voltar aos seus lugares, sob pena de perda de mandato, essa sim, justificada, por absentismo. Ou seja, da desagregação da antiga maioria saída das últimas eleições de 2014 resultou uma nova maioria, que devemos acreditar empenhada na estabilidade político-governativa do País, coisa que o PAIGC já demonstrou ser incapaz de oferecer, apesar de ter reunido todas as condições para tal.
Na lógica da doutrina constitucional do nosso sistema parlamentar, os governos formam-se com a base em maiorias que possam garantir a governabilidade, e não forçosamente nas maiorias saídas das urnas, como aliás recentemente se verificou em Portugal, e se está a desenhar em Espanha, para não falar do caso do Luxemburgo.
Há que fazer uma leitura dinâmica e atual dos factos, e não estática. À luz da nossa Constituição semipresidencialista, o Governo emana e responde politicamente perante o parlamento, considerado o centro da vida política (art.º 103.º).
Há vários precedentes, dos quais podemos citar, em Fevereiro de 2007, o então presidente da ANP, do PAIGC, que defendia: «os Deputados são candidatos apresentados pelos partidos políticos para as Eleições Legislativas, declarados Eleitos e cujos Nomes foram publicados no Boletim Oficial».
No Acórdão n.º 1/06 (do Proc. N.º 2/05) do Supremo Tribunal da Justiça estatuía-se que «… uma vez que as eleições legislativas se expressam na escolha de Deputados, ainda que enquadrados mas não absorvidos pelos Partidos Políticos.»
Francisco Benante, defendia pouco depois, no Diário de Notícias de 20 de Março de 2007: «Agora, quem tem de se pronunciar é o Presidente da República», aludindo às regras constitucionais em vigor no país, considerando-as razoavelmente semelhantes às portuguesas.
Noutro precedente, mas desta vez a favor do PAIGC, a mesma agência noticiava, a 22 de Setembro de 2004, que o PUSD expulsara oito deputados, por minarem a disciplina partidária votando o Orçamento ao lado do PAIGC, exigindo a sua substituição nas Comissões, mas nunca colocando em causa o seu mandato.
Ou seja, nunca, na Guiné-Bissau, como hoje, se tinha ofendido tão óbvia e ostensivamente a Constituição, ao ponto de tentar revogar mandatos unipessoais aos deputados. Ao principal artífice de tal habilidade, aplicou-se a lei de Talião, que, em suma, apregoa «Não faças aos outros aquilo que não gostas que te façam a ti».
Havendo necessidade de um esclarecimento sobre a atual situação política, ainda antes de darmos início à nossa argumentação jurídica e análise constitucional, façamos um pequeno resumo de como chegámos a esta situação caótica, de desregulação institucional e de subversão dos mais elementares princípios do Direito ou mesmo do simples bom senso.
Tudo gira em torno daquilo que se passou no dia 18 de Janeiro na Assembleia Nacional Popular (ANP), que passo a tentar resumir: estava reunido o plenário, tendo por ordem de trabalho a «segunda volta» do Programa que deveria ditar o futuro do Governo, que se encontrava presente, estando assim reunidas todas as condições requeridas.
O ex-presidente da ANP transportava um pesado fardo de abuso de autoridade num passado recente, de desrespeito pelo plenário, pelos prazos constitucionais, pelas ordens de trabalho e, em última análise, pelos deputados e deputadas da Nação nominalmente eleitos, na expectativa sempre frustrada de conseguir reunir uma maioria favorável aos seus intentos.
Ao verificar que o Comissário da Polícia da Ordem Pública (POP), José António Marques, cumprira os procedimentos legais, baseando-se no Boletim Oficial, e o resultado seria de novo desfavorável, pela enésima vez, Cipriano Cassamá anunciou a suspensão invocando «falta de condições de segurança». No entanto, nunca a segurança fora tão forte, como nesse último dia do Governo de Carlos Correia, em que até o ex-Primeiro-Ministro foi revistado, para entrar no hemiciclo.
Ora as reuniões da plenária só podem ser interrompidas nos termos do art.º 69.º do Regimento da ANP.
Quanto aos argumentos jurídicos, em defesa da legitimidade do novo Presidente da Mesa da ANP, Alberto Nambeia, julgo que foi sobre os artigos 23.º e 24.º do Regimento, que incidiram as principais críticas, pelo que quero começar precisamente por aí. O Artigo 23.º fala-nos sobre o Mandato do Presidente da ANP. O legislador traduz a configuração assumida pelo Parlamento, pelo que, no caso de alterações substanciais na maioria, é lícito que esta maioria, em democracia, assuma esse mandato em consonância, em nome do povo.
E o Artigo 24.º prevê a Substituição do Presidente da ANP. O ex-presidente deu FALTA DE COMPARÊNCIA (pois a sessão parlamentar fora suspensa e não encerrada, como o próprio defendeu posteriormente), e viu-se IMPEDIDO de continuar, embora estivesse presente nas instalações da ANP.
O ex-presidente da ANP reuniu assim cumulativamente as condições de faltoso e de impedido. Verificando-se o QUÓRUM (art.º 60.º do Regimento) suficiente para permitir deliberar. Em consequência, nos termos constitucionais e regimentares, o colectivo parlamentar validou o segundo Vice-Presidente, conforme estipulado no primeiro ponto desse artigo 24.º, para dar provimento à substituição do ex-Presidente, considerado indigno para o exercício do cargo, após recorrentes e grosseiras violações do Regimento e do respeito devido à dignidade da instituição.
Em síntese, o PAIGC praticou uma série de atropelos e deslealdades, recorrendo à sua máquina de manipulação, protelando indefinidamente qualquer solução que lhe fosse desfavorável, abusando dos mais absurdos subterfúgios legais para subverter Constituição e regras regimentais da ANP.
Perante a sucessão de inúmeros pequenos golpes na legalidade, a paciência esgotou-se. A Assembleia Nacional Popular é o órgão competente por excelência para dirimir esta alegada crise, como recentemente se resolveu em Portugal, porque tem mecanismos próprios à luz do Regimento e da Constituição da República, porque se deve evitar a judicialização dos atos políticos. Os problemas políticos devem ser resolvidos politicamente.
O Governo de Carlos Correia caiu no momento em que abandonou o Parlamento e cabe agora ao Presidente da República convidar o PRS para propor uma solução política.
O ex-Governo não tem condições políticas para continuar a reunir em Conselho de Ministros, ou sequer a invocar a qualidade de governantes. Entre os casos feridos de ilegitimidade, está a exoneração apressada e arbitrária, na Segunda-Feira passada, do Comissário da POP, a qual deve ser, para todos os efeitos, considerada nula e inexistente.
Quanto aos deputados do PAIGC, deverão voltar aos seus lugares, sob pena de perda de mandato, essa sim, justificada, por absentismo. Ou seja, da desagregação da antiga maioria saída das últimas eleições de 2014 resultou uma nova maioria, que devemos acreditar empenhada na estabilidade político-governativa do País, coisa que o PAIGC já demonstrou ser incapaz de oferecer, apesar de ter reunido todas as condições para tal.
Na lógica da doutrina constitucional do nosso sistema parlamentar, os governos formam-se com a base em maiorias que possam garantir a governabilidade, e não forçosamente nas maiorias saídas das urnas, como aliás recentemente se verificou em Portugal, e se está a desenhar em Espanha, para não falar do caso do Luxemburgo.
Há que fazer uma leitura dinâmica e atual dos factos, e não estática. À luz da nossa Constituição semipresidencialista, o Governo emana e responde politicamente perante o parlamento, considerado o centro da vida política (art.º 103.º).
Há vários precedentes, dos quais podemos citar, em Fevereiro de 2007, o então presidente da ANP, do PAIGC, que defendia: «os Deputados são candidatos apresentados pelos partidos políticos para as Eleições Legislativas, declarados Eleitos e cujos Nomes foram publicados no Boletim Oficial».
No Acórdão n.º 1/06 (do Proc. N.º 2/05) do Supremo Tribunal da Justiça estatuía-se que «… uma vez que as eleições legislativas se expressam na escolha de Deputados, ainda que enquadrados mas não absorvidos pelos Partidos Políticos.»
Francisco Benante, defendia pouco depois, no Diário de Notícias de 20 de Março de 2007: «Agora, quem tem de se pronunciar é o Presidente da República», aludindo às regras constitucionais em vigor no país, considerando-as razoavelmente semelhantes às portuguesas.
Noutro precedente, mas desta vez a favor do PAIGC, a mesma agência noticiava, a 22 de Setembro de 2004, que o PUSD expulsara oito deputados, por minarem a disciplina partidária votando o Orçamento ao lado do PAIGC, exigindo a sua substituição nas Comissões, mas nunca colocando em causa o seu mandato.
Ou seja, nunca, na Guiné-Bissau, como hoje, se tinha ofendido tão óbvia e ostensivamente a Constituição, ao ponto de tentar revogar mandatos unipessoais aos deputados. Ao principal artífice de tal habilidade, aplicou-se a lei de Talião, que, em suma, apregoa «Não faças aos outros aquilo que não gostas que te façam a ti».
Carmelita Pires
(Ex-Ministra da Justiça)
sexta-feira, 22 de janeiro de 2016
Carmelita Pires na RTP África
«Provavelmente o Presidente da República irá convidar o PRS a formar Governo» Ver entrevista a partir do minuto 5.
quinta-feira, 21 de janeiro de 2016
Amílcar Cabral
Que este teu «chão» seja capaz, em tua honra, de implementar o Programa Máximo!
Tu, que ensinavas a:
«Andar pelos nossos próprios pés».
«A nossa própria realidade não pode ser transformada a não ser pelo seu conhecimento concreto».
Na vanguarda da luta, não ensinavas a:
mentir,
a abusar do poder,
a cultivar a mediocridade.
Nesta nossa terra, quem tem um olho é rei e quem tem dois furam-se os dois, para que não levante a cabeça e o sistema subsista. Deixaste-nos há 43 anos e continuam a atraiçoar a tua/nossa memória. Desde que te assassinaram, os jagudis tomaram o teu Partido de assalto, e lá continuam entrincheirados, fazendo destas tuas gentes e aspirações uma terra de ninguém, entregue ao opróbrio do mundo! Melhor sorte merecia a tua herança...
«Uns têm ideias, dedicam-se ao exercício da mente, fazem questão de partilhar suas ideias, seus pensamentos com os demais, tendo em conta uma causa comum. Outros, apenas sabem desvirtuar essas ideias, esses pensamentos, sem apresentarem nada estruturado, e em prol da causa comum, que não a vaidade dos bens materiais e do estatuto que ostentam.» (Didinho)
Nesta nossa terra, quem tem um olho é rei e quem tem dois furam-se os dois, para que não levante a cabeça e o sistema subsista. Deixaste-nos há 43 anos e continuam a atraiçoar a tua/nossa memória. Desde que te assassinaram, os jagudis tomaram o teu Partido de assalto, e lá continuam entrincheirados, fazendo destas tuas gentes e aspirações uma terra de ninguém, entregue ao opróbrio do mundo! Melhor sorte merecia a tua herança...
«Uns têm ideias, dedicam-se ao exercício da mente, fazem questão de partilhar suas ideias, seus pensamentos com os demais, tendo em conta uma causa comum. Outros, apenas sabem desvirtuar essas ideias, esses pensamentos, sem apresentarem nada estruturado, e em prol da causa comum, que não a vaidade dos bens materiais e do estatuto que ostentam.» (Didinho)
quinta-feira, 14 de janeiro de 2016
Lembraram-se agora? Poupem-nos...!
Face a pretensas análises cujo teor reprovamos, por resultarem de intrigas urdidas internamente, contrariando e deitando maquiavelicamente a perder todo um esforço porfiadamente desenvolvido, publicamos hoje a tradução do discurso proferido, em francês, perante a 83ª Assembleia da INTERPOL, como Ministra da Justiça, em representação da Guiné-Bissau, no Mónaco, cujo Relatório de Missão se pode aqui encontrar na barra lateral direita, logo por baixo da passagem de fotografias.
Após a cerimónia de abertura, a 3 de Novembro de 2014, os trabalhos iniciaram-se no dia seguinte, dedicados ao século de cooperação policial decorrido. Tomei a palavra no ponto referente ao crime transnacional e insurgi-me contra o preconceito que reduz a Guiné-Bissau a um «Narco-Estado». Vários Ministros e Diplomatas me quiseram dar pessoalmente os parabéns pela alocução, afirmando que a Guiné-Bissau estava no bom caminho.
Numa outra missão, no mesmo âmbito, cerca de seis meses depois, a 23 de Abril do ano passado, participei igualmente na 2.ª Reunião Ministerial Contra o Tráfico de Drogas, em Moscovo. Na sessão de abertura foram lidas as mensagens do Presidente da Federação da Rússia, e do Secretário Geral das Nações Unidas, Vladimir Putin e Ban Ki Moon. Os chefes das delegações debruçaram-se sobre os malefícios da droga para a saúde, a sua consequência nefasta para a economia global, através do branqueamento de capitais pelo crime organizado e a ameaça cada vez mais preocupante que o tráfico ilícito de drogas constitui para a segurança e estabilidade interna dos países, por meio da sua ligação e financiamento do terrorismo, sobretudo nos países menos desenvolvidos e particularmente na Africa Ocidental. Coube-me a honra, como Ministra da Justiça da Guiné-Bissau, proferir a última intervenção antes do discurso de encerramento do Director do Serviço Federal para o Controlo de Tráfico de Drogas, na qual contextualizei a origem do fenómeno, as condições que favoreceram a sua disseminação e as consequências para o país, voltando a realçar a vontade política de combater este fenómeno traduzida nos engajamentos assumidos a nível regional e internacional, na implementação da cooperação técnica com os parceiros internacionais, enfatizando a elaboração pelo actual Governo de um Plano Estratégico da Polícia Judiciária, que contempla medidas de combate ao tráfico de drogas e crimes correlacionados, discurso igualmente muito apreciado e aplaudido.
À margem dessas missões, tentámos reunir, na altura, informações da tecnologia russa de drones de vigilância, no sentido de abordar as autoridades para que a cooperação oferecida se traduzisse naquilo que precisamos (controlo e vigilância). Estávamos nessa altura em vias de fazer um protocolo para trazer lanchas de intercepção, oferecidas pelos americanos, e talvez pudéssemos vigiar as nossas águas com sistemas (de outra origem) relativamente simples e baratos que tivéssemos gente para operar: teríamos assim um conjunto soberano minimamente consistente e operacional, independente de uns e de outros. No entanto, não queríamos acreditar na resposta: depois de se informarem, a resposta (de Bissau?) foi que «não tinha cobertura política». Quando somos nós próprios que damos tiros nos pés!
Deixo-vos então a referida tradução:
«Alteza Sereníssima, o Príncipe Alberto do Mónaco
Excelência a Presidente da INTERPOL
Excelência o Secretário Geral da INTERPOL (foto)
Excelentíssimos Ministros e Ministras
Meus Senhores e minhas Senhoras
Falando em nome da Guiné-Bissau, na qualidade de Ministra da Justiça, alegramo-nos com esta participação na 83ª Assembleia Geral da INTERPOL, que marca o centenário da cooperação policial internacional, precisamente aqui onde, há cem anos, o homónimo do actual herdeiro do Principado e primeiro desse nome, Alberto, reuniu os pioneiros. Fazêmo-lo com um enorme interesse e uma atenção especial dedicada à importância vital para o nosso país, da luta contra o crime transnacional.
A Guiné-Bissau é um pequeno país da África do Oeste, com aproximadamente trinta e seis mil quilómetros quadrados e não mais de um milhão e meio de habitantes, o qual, como decerto já se deram conta, se tornou infelizmente conhecido, sobretudo nos últimos dez anos, por ter servido de trânsito para a cocaína, especialmente destinada à Europa, um tráfico com origem na América latina, visando os países mais frágeis, com as instituições mais fracas e vulneráveis da nossa sub-região.
Tornou-se irritante, para os meus compatriotas, sempre que lêem o nome do país na imprensa internacional, é pelas piores razões, associando-o a esse tráfico, chegando frequentemente ao ponto de a Guiné-Bissau ser tratada como um Narco estado, projectando assim uma imagem muito negativa junto do investimento estrangeiro, do qual temos uma necessidade premente para conseguirmos valorizar os nossos múltiplos recursos naturais, tornando-se também altamente nocivo para o nosso imenso potencial turístico de bio-diversidade, que continua por explorar.
Decerto conseguem imaginar as duras condições de inquérito que experimentamos neste país sub-desenvolvido, que é o meu, e a falta de meios com que nos debatemos, sobretudo quando se trata de enfrentar o crime organizado, que não olha a fronteiras e se torna mesmo transcontinental, ultrapassando claramente as nossas capacidades de investigação à escala local. O meu país poderia tornar-se num caso de estudo...
Como quando, há alguns anos, tivemos de recorrer à INTERPOL quando apreendemos um avião comercial, proveniente da América do Sul, transportando um enorme carregamento de droga. Aproveitamos esta oportunidade para exprimir a nossa gratidão pelo apoio prestado à Guiné-Bissau no quadro da cooperação, em particular relativamente nas questões delicadas da criminalidade transnacional ligada ao tráfico de droga.
Experimentámos as funestas consequências dissolutivas, para as estruturas políticas de um país pobre e debilitado, que pode ter o dinheiro com origem nessas actividades ilícitas. Uma série de golpes de Estado pontuaram o nosso percurso, estando agora o país a começar a sair de um período de anomalia constitucional. Novos poderes foram legitimamente eleitos, foi nomeada uma nova direcção militar, o que permite alimentar a esperança que venha a ser colocado em acção um programa de governação favorecendo a consolidação do Estado de Direito, com o reforço da autoridade do Estado e a aplicação da Lei.
Estamos decididos a não continuar a ser uma presa fácil para o crime transnacional, recuperando a nossa credibilidade no concerto das Nações, e por essa razão, torna-se para nós de extrema importância garantir os meios que nos permitem agir e recuperar a confiança, tanto da parte dos nossos concidadãos, como também da opinião pública mundial, na capacidade da Polícia para desempenhar a sua missão. Esperamos assim colocar um termo no ciclo vicioso de instabilidade política e fragilidade estatal.
Com a aceleração da circulação, tanto de mercadorias como de pessoas, mas também da informação, enfrentamos novas ameaças criminais à escala global, como o tráfico de seres ou órgãos humanos, de droga e estupefacientes, ou o terrorismo. Face a ameaças globais, são necessárias respostas globais e concertadas. Se os bandidos cooperam, os criminosos se organizam e se modernizam, o grande desafio para a Polícia é, hoje como há um século, antecipar o seu jogo.
Terminamos na certeza de que toda a gente aqui poderá recolher ensinamentos válidos durante esta Assembleia, demonstrando as inegáveis vantagens do reforço da cooperação policial, organizada a nível internacional, e da sua integração na nossa prática comum, para enfrentar com sucesso a dimensão globalizante e a crescente sofisticação das redes do crime, que já não respeitam as fronteiras tradicionais.
Muito obrigado pela Vossa atenção.»
Carmelita Pires
Após a cerimónia de abertura, a 3 de Novembro de 2014, os trabalhos iniciaram-se no dia seguinte, dedicados ao século de cooperação policial decorrido. Tomei a palavra no ponto referente ao crime transnacional e insurgi-me contra o preconceito que reduz a Guiné-Bissau a um «Narco-Estado». Vários Ministros e Diplomatas me quiseram dar pessoalmente os parabéns pela alocução, afirmando que a Guiné-Bissau estava no bom caminho.
Numa outra missão, no mesmo âmbito, cerca de seis meses depois, a 23 de Abril do ano passado, participei igualmente na 2.ª Reunião Ministerial Contra o Tráfico de Drogas, em Moscovo. Na sessão de abertura foram lidas as mensagens do Presidente da Federação da Rússia, e do Secretário Geral das Nações Unidas, Vladimir Putin e Ban Ki Moon. Os chefes das delegações debruçaram-se sobre os malefícios da droga para a saúde, a sua consequência nefasta para a economia global, através do branqueamento de capitais pelo crime organizado e a ameaça cada vez mais preocupante que o tráfico ilícito de drogas constitui para a segurança e estabilidade interna dos países, por meio da sua ligação e financiamento do terrorismo, sobretudo nos países menos desenvolvidos e particularmente na Africa Ocidental. Coube-me a honra, como Ministra da Justiça da Guiné-Bissau, proferir a última intervenção antes do discurso de encerramento do Director do Serviço Federal para o Controlo de Tráfico de Drogas, na qual contextualizei a origem do fenómeno, as condições que favoreceram a sua disseminação e as consequências para o país, voltando a realçar a vontade política de combater este fenómeno traduzida nos engajamentos assumidos a nível regional e internacional, na implementação da cooperação técnica com os parceiros internacionais, enfatizando a elaboração pelo actual Governo de um Plano Estratégico da Polícia Judiciária, que contempla medidas de combate ao tráfico de drogas e crimes correlacionados, discurso igualmente muito apreciado e aplaudido.
À margem dessas missões, tentámos reunir, na altura, informações da tecnologia russa de drones de vigilância, no sentido de abordar as autoridades para que a cooperação oferecida se traduzisse naquilo que precisamos (controlo e vigilância). Estávamos nessa altura em vias de fazer um protocolo para trazer lanchas de intercepção, oferecidas pelos americanos, e talvez pudéssemos vigiar as nossas águas com sistemas (de outra origem) relativamente simples e baratos que tivéssemos gente para operar: teríamos assim um conjunto soberano minimamente consistente e operacional, independente de uns e de outros. No entanto, não queríamos acreditar na resposta: depois de se informarem, a resposta (de Bissau?) foi que «não tinha cobertura política». Quando somos nós próprios que damos tiros nos pés!
Deixo-vos então a referida tradução:
«Alteza Sereníssima, o Príncipe Alberto do Mónaco
Excelência a Presidente da INTERPOL
Excelência o Secretário Geral da INTERPOL (foto)
Excelentíssimos Ministros e Ministras
Meus Senhores e minhas Senhoras
Falando em nome da Guiné-Bissau, na qualidade de Ministra da Justiça, alegramo-nos com esta participação na 83ª Assembleia Geral da INTERPOL, que marca o centenário da cooperação policial internacional, precisamente aqui onde, há cem anos, o homónimo do actual herdeiro do Principado e primeiro desse nome, Alberto, reuniu os pioneiros. Fazêmo-lo com um enorme interesse e uma atenção especial dedicada à importância vital para o nosso país, da luta contra o crime transnacional.
A Guiné-Bissau é um pequeno país da África do Oeste, com aproximadamente trinta e seis mil quilómetros quadrados e não mais de um milhão e meio de habitantes, o qual, como decerto já se deram conta, se tornou infelizmente conhecido, sobretudo nos últimos dez anos, por ter servido de trânsito para a cocaína, especialmente destinada à Europa, um tráfico com origem na América latina, visando os países mais frágeis, com as instituições mais fracas e vulneráveis da nossa sub-região.
Tornou-se irritante, para os meus compatriotas, sempre que lêem o nome do país na imprensa internacional, é pelas piores razões, associando-o a esse tráfico, chegando frequentemente ao ponto de a Guiné-Bissau ser tratada como um Narco estado, projectando assim uma imagem muito negativa junto do investimento estrangeiro, do qual temos uma necessidade premente para conseguirmos valorizar os nossos múltiplos recursos naturais, tornando-se também altamente nocivo para o nosso imenso potencial turístico de bio-diversidade, que continua por explorar.
Decerto conseguem imaginar as duras condições de inquérito que experimentamos neste país sub-desenvolvido, que é o meu, e a falta de meios com que nos debatemos, sobretudo quando se trata de enfrentar o crime organizado, que não olha a fronteiras e se torna mesmo transcontinental, ultrapassando claramente as nossas capacidades de investigação à escala local. O meu país poderia tornar-se num caso de estudo...
Como quando, há alguns anos, tivemos de recorrer à INTERPOL quando apreendemos um avião comercial, proveniente da América do Sul, transportando um enorme carregamento de droga. Aproveitamos esta oportunidade para exprimir a nossa gratidão pelo apoio prestado à Guiné-Bissau no quadro da cooperação, em particular relativamente nas questões delicadas da criminalidade transnacional ligada ao tráfico de droga.
Experimentámos as funestas consequências dissolutivas, para as estruturas políticas de um país pobre e debilitado, que pode ter o dinheiro com origem nessas actividades ilícitas. Uma série de golpes de Estado pontuaram o nosso percurso, estando agora o país a começar a sair de um período de anomalia constitucional. Novos poderes foram legitimamente eleitos, foi nomeada uma nova direcção militar, o que permite alimentar a esperança que venha a ser colocado em acção um programa de governação favorecendo a consolidação do Estado de Direito, com o reforço da autoridade do Estado e a aplicação da Lei.
Estamos decididos a não continuar a ser uma presa fácil para o crime transnacional, recuperando a nossa credibilidade no concerto das Nações, e por essa razão, torna-se para nós de extrema importância garantir os meios que nos permitem agir e recuperar a confiança, tanto da parte dos nossos concidadãos, como também da opinião pública mundial, na capacidade da Polícia para desempenhar a sua missão. Esperamos assim colocar um termo no ciclo vicioso de instabilidade política e fragilidade estatal.
Com a aceleração da circulação, tanto de mercadorias como de pessoas, mas também da informação, enfrentamos novas ameaças criminais à escala global, como o tráfico de seres ou órgãos humanos, de droga e estupefacientes, ou o terrorismo. Face a ameaças globais, são necessárias respostas globais e concertadas. Se os bandidos cooperam, os criminosos se organizam e se modernizam, o grande desafio para a Polícia é, hoje como há um século, antecipar o seu jogo.
Terminamos na certeza de que toda a gente aqui poderá recolher ensinamentos válidos durante esta Assembleia, demonstrando as inegáveis vantagens do reforço da cooperação policial, organizada a nível internacional, e da sua integração na nossa prática comum, para enfrentar com sucesso a dimensão globalizante e a crescente sofisticação das redes do crime, que já não respeitam as fronteiras tradicionais.
Muito obrigado pela Vossa atenção.»
Carmelita Pires
quarta-feira, 13 de janeiro de 2016
24º Aniversário do PRS
As instituições da República face aos desafios da estabilidade política e governativa
Bissau, 13 de Janeiro de 2016
Conferência da Presidente do PUSD, Dr.ª Carmelita Pires, por ocasião das comemorações do XXIV aniversário do Partido de Renovação Social.
Bom dia a todos e todas participantes neste aniversário do Partido da Renovação Social.
É para mim uma grande honra corresponder ao convite que me foi endereçado, para participar como conferencista nestas comemorações do 24º aniversário. Como Presidente do PUSD, agradeço ao meu homólogo Sua Excelência Alberto Nambeia, digno Presidente deste grande Partido, por esta oportunidade, para aqui partilhar convosco um pouco do passado e das lembranças do CAMINHO COMUM que até aqui nos trouxe.
1) O PRS e seus contributos políticos em retrospectiva
2) As instituições da República face aos desafios
3) O papel do PRS no resgate do Estado
4) Estabilidade política e boa governação
Estabelecer um balanço, recordar os MOMENTOS CHAVE, os bons e os maus, é essencial para uma análise consequente da realidade actual e dos trilhos que se nos oferecem daqui para a frente, para que possamos aproveitar os ensinamentos e o espírito dos nossos maiores, evitando cair nos mesmos erros, nos quais a juventude, pela falta de experiência, não deixa inevitavelmente de cair.
Aos 24 anos, é idade para assentar, para criar família, estabelecer laços sociais duráveis e sustentáveis. Passou o tempo da brincadeira, da exploração, das aventuras inconsequentes, sem prejuízo de tudo aquilo que essa idade inquieta e brincalhona da juventude nos ensinou. É MOMENTO DE RESPONSABILIZAÇÃO, altura para dar mostras de um certo RIGOR NA ABORDAGEM DA VIDA.
Farão amanhã, dia 14 de Janeiro, precisamente, duas dúzias de anos que nasceu este Partido. Ao seu líder histórico, KUMBA YALÁ, que ousou desafiar o monopartidarismo do PAIGC, ficaremos para sempre a dever, não apenas a abertura democrática, mas igualmente a irreverência, a insatisfação e a liberdade de questionar. Também a inclinação para a utopia, de sonhar com outras fórmulas políticas, que permitam conduzir o nosso povo ao almejado desenvolvimento, sempre, até aqui, ADIADO.
Foi esse ímpeto, essa incrível FORÇA ANÍMICA DE CONTESTAÇÃO, que animava os populares discursos de Kumba e se constituía no seu carisma contagiante, que o conduziram à Presidência da República na viragem do milénio, com quase três quartos dos votos do eleitorado (cerca de 72%), numa alternância impensável, poucos anos antes, face ao entranhado predomínio do PAIGC, que ninguém ousava contestar.
O PRS tinha então apenas oito anos, a idade de uma criança. Quando olhamos para o passado, podemos encará-lo de uma perspectiva optimista ou pessimista. Insistir apenas nas boas recordações é esquecer a outra face da moeda, aquilo que correu mal e nos deixou marcas, que por vezes não saram. Por outro lado, focar apenas naquilo que correu mal, não deixará de nos conduzir inevitavelmente à depressão. Como em tudo na vida, precisamos de uma certa temperança, de um ponto de equilíbrio... Ponto esse que parece obstinar-se em fugir de nós, como povo e como nação.
Numa avaliação imparcial do percurso do PRS, pode constatar-se que sempre foi, em parte devido à personalidade vincada do seu líder, um partido de CONTRA-PODER. E foi-o a sério! No entanto, ser realmente bom no contra-poder, não quer dizer que se esteja preparado para assumir o poder. Um partido demasiado jovem, sem uma identidade bem estabelecida, foi assim precocemente chamado a assumir responsabilidades políticas para as quais ainda não estava preparado.
HOJE, é dar provas de MATURIDADE, admitir que as coisas não correram nada bem, nesse capítulo, ao PRS.
A análise desapaixonada da experiência governativa do Partido resulta numa percepção negativa por parte da maioria dos actores, internos e externos, que ainda hoje perdura, constituindo-se como factor de bloqueio mental, face à perspectiva de formação de Governo por este Partido, encontrando resistências de várias ordens e a vários níveis.
No entanto, mesmo esse «pé atrás» das pessoas, não é comprometedor, para um PARTIDO JOVEM, à espera de uma oportunidade para dar um contributo decisivo no salto para a frente que todos e todas guineenses anseiam.
Bem mais grave é a actual situação do PAIGC, um PARTIDO SÉNIOR já bem entrado na vida, com mais de meio século, invariavelmente responsável pela Governação do país, à excepção desse curto hiato a que já nos referimos.
Cumprido com sucesso o PROGRAMA MÍNIMO, que consistia na independência formal, está hoje absolutamente claro, mais de quatro décadas passadas, que o PAIGC não soube «dar o salto», transformando-se num agente de mudança positiva.
Cabral antecipara e tentara prevenir tal desfecho, dizendo (em crioulo), sobre o Encontro de Ensalma: «A luta para a nossa independência, é o programa mínimo que estamos a cumprir. Não pensem que vamos todos mandar em Bissau… A nossa independência vai ser entregue à gente que virá ao nosso encontro para a assumir. Essa gente é que irá começar a cumprir o Programa Maior que é compor a terra, tarefa mais complicada.»
Ora parece que os seus antigos camaradas entenderam tudo ao contrário: têm sistematicamente encarado o Partido como alavanca para o seu BENEFÍCIO PARTICULAR e não da «coisa pública».
O PAIGC mantém-se até hoje refém de INTERESSES PESSOAIS MESQUINHOS, com os desastrosos resultados que conhecemos para a nossa Tabanca grande, a República da Guiné-Bissau.
Aqueles que se auto-intitulam «sucessores» e herdeiros nominais de Cabral, instalaram no seu Partido uma CULTURA DE HIPOCRISIA de tal ordem, que fatalmente conduziu a uma total SUBVERSÃO DOS PRINCÍPIOS E VALORES que o regiam, traindo a sua memória e ensinamentos.
A nossa história pós independência resume-se a uma ininterrupta sucessão de intrigas, rixas e tricas políticas, quezílias institucionais, assassinatos selectivos, dando origem a uma imparável e ininterrupta série de golpes e contragolpes de Estado, intentonas reais ou inventadas (até deram origem ao curioso termo de «cultura» política muito nosso de “inventonas”), culminando recorrente e invariavelmente em «TRANSIÇÕES», que mais não são que ingratos retornos ao ponto de partida, num desesperante CICLO VICIOSO que é absolutamente necessário ter a coragem para interromper.
Que imagem, do ponto de vista externo, projectamos?
O de uma «AGENDA NACIONAL» de luta fratricida pelo poder e pela sua manutenção (no epicentro dos problemas); um ambiente de FALTA DE COESÃO em torno de consensos mínimos de governabilidade, de antigos ódios a que se juntam novas incompatibilidades, cujo primeiro sintoma é a INOBSERVÂNCIA DA LEI E A SUBVERSÃO DO DIREITO, que os oponentes atropelam a bel-prazer procurando interpretações, mesmo as mais disparatadas, consoante as conveniências do momento.
Perante este inaudito GRAU DE SUBVERSÃO, de CACIQUISMO e de fabrico de CLIENTELAS, que a actual Direcção do PAIGC elevou para patamares estratosféricos de NEPOTISMO e de SUBSERVIÊNCIA, o país encontra-se claramente à deriva, em plena CRISE MORAL E DE VALORES, mergulhado num CAOS IDEOLÓGICO extremamente dissolvente para o próprio conceito de «Estado». Depois de, apesar da nossa pequena dimensão territorial, termos sido colocados no mapa do mundo, como um dos poucos povos colonizados que se libertou por si próprio, e, nesse contexto, recolhido a simpatia e benevolência externa, graças a Amílcar Cabral; depois de termos passado, para muitos, de Micro-Estado a Narco-Estado; estamos na iminência de ver o nosso país inteiramente contaminado por esse Partido doentio (em fase terminal) que se tornou o PAIGC, e de nos tornarmos um autêntico NÃO-ESTADO.
Efectivamente, face ao DISFUNCIONAMENTO da Justiça, da Educação, da Saúde; perante o completo desmantelamento do sector produtivo; perante a CORRUPÇÃO galopante «especializada» em delapidar fundos externos sem que se possam constatar quaisquer MELHORIAS AO NÍVEL DA POPULAÇÃO; perante a incapacidade do ESTADO DE CUMPRIR COM AS SUAS MAIS ELEMENTARES OBRIGAÇÕES… chego a questionar-me se ainda é possível falar seriamente de ESTADO ou sequer de INSTITUIÇÕES, de acordo com o tema que me foi proposto, «As instituições da República face aos desafios da estabilidade política e governativa». Parece ficção científica!
Ainda antes de abordar os «desafios» tornava-se necessário clarificar este lamentável quadro institucional.
Devido ao «Estado» de VERDADEIRA FARSA a que isto chegou, parece já impossível compor a nossa terra com simples «reformas»: é necessária uma RUPTURA RADICAL DE MÉTODOS, PROCEDIMENTOS, mas sobretudo, de MENTALIDADES, conforme me tenho vindo a bater, e o PUSD defendeu na última campanha eleitoral, que esteve na origem da actual distribuição parlamentar.
Durante a campanha eleitoral, várias pessoas se me dirigiram, chegando a pedir desculpa por não votarem no PUSD, alegando que iriam votar, mesmo a contra-gosto, no PAIGC, como forma de repor aquilo que entendiam como a legalidade constitucional, após a interrupção motivada pelo 12 de Abril. Essa convicção generalizada ofereceu ao PAIGC uma OPORTUNIDADE ÚNICA DE GOVERNAÇÃO e de implementação das reconhecidamente necessárias e URGENTES REFORMAS ESTRUTURAIS. O Partido contava com uma expressiva MAIORIA ABSOLUTA NA ANP (mesmo se sobredimensionada) e um PRESIDENTE da mesma cor. O PRS e restantes partidos pareciam condenados ao papel de oposição parlamentar.
No entanto, num gesto surpreendente e inovador, se bem que criticado por alguns, o Presidente do PAIGC, partido vencedor e que por essa razão viria a ser convidado para Primeiro-Ministro, optou pela constituição de um GOVERNO INCLUSIVO, do qual participaram os nossos dois Partidos, o PRS e o PUSD. No nosso caso, fui convidada para Ministra da Justiça, cargo que já havia ocupado anteriormente, cuja incumbência aceitei de boa-fé, esperançada no DESAFIO, sem precedentes, de ESTABILIDADE GOVERNATIVA e de CREDIBILIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES que a proposta permitia razoavelmente antecipar.
Apesar de parecer reunir todos os ingredientes para se tornar numa aposta de sucesso, eis que o titular da chefia do Governo revela, na prática, não reunir qualidades de diálogo para liderar um projecto dessa grandeza e ambição. Face aos primeiros contratempos, rapidamente sobressaiu um carácter autocrata, confundindo inclusividade com obediência cega ou subserviência acrítica.
Afinal, aquilo que entendíamos como ALIANÇA POLÍTICA, não passava de uma tentativa de silenciamento, face às investidas de corrupção visando o aparelho de Estado, na linha do assalto descarado a que já estamos demasiado habituados.
Traídas as esperanças, aqui a «porca torceu o rabo» e voltámos «à vaca fria».
Tudo acabaria, mais uma vez, num GOVERNO DE COSTAS VOLTADAS PARA O POVO e em EXPECTATIVAS ADIADAS: em vez de um colectivo com um objectivo, tínhamos um grupo tenso e dividido, com falta de visão estratégica, que os «retiros» entretanto promovidos disfarçavam mal. Seguindo o exemplo vindo de cima, e perante a FALTA DE AUTORIDADE MORAL, certas pessoas, em vez de governar, governaram-se.
Afinal de contas, tudo continuava na mesma, apenas mudando na aparência de inclusão. Estou particularmente bem posicionada para o afirmar, depois de ter visto a Justiça relegada para último plano, sérios avisos à navegação caírem em saco roto, ou mesmo tentativas de escamotear, senão mesmo ignorar, o indiciamento de governantes. O que acabou por contribuir para a queda do Governo, ou, dito de outra forma, para o fim do desgoverno, accionado pela Presidência da República, fazendo uso das suas prerrogativas constitucionais.
Parece-me desnecessário lembrar as peripécias que se seguiram, a ingratidão da direcção do PAIGC, em relação ao PROJECTO INICIADO CATORZE MESES ANTES, descontinuando uma proposta para uma legislatura, patenteando inconsistência e dando assim a entender a ligeireza com que encara as parcerias estabelecidas: é com facilidade que são descartadas sem qualquer justificação pública ou explicação para com as pessoas e Partidos envolvidos, que haviam apoiado com o seu capital político.
Peço que me perdoem, se vos canso com estas lamúrias, de ESPERANÇAS MAIS UMA VEZ TRAÍDAS.
Também o PRS provou do veneno do PAIGC. Espero sinceramente que não se deixe contaminar pela peçonha, tornando-se numa simples fotocópia desse Partido, que ABUSA DA MEMÓRIA E PRESTÍGIO DE CABRAL, atraiçoando o espírito do seu fundador. Pois o PRS, como segundo maior Partido, pode vir a ter um importante papel no RESGATE DO NOSSO PAÍS E DAS INSTITUIÇÕES, EM PROL DA ESTABILIDADE.
Efectivamente, o mal-estar e as divisões no seio do PAIGC mais não fazem que traduzir a desilusão em relação às opções políticas da Direcção e à falta de capacidade de diálogo demonstrada. A recente CISÃO DE UM GRUPO DE DEPUTADOS deste Partido, abstendo-se na votação da proposta de PROGRAMA DE GOVERNO, inviabilizando-a pela primeira vez, veio dar azo a NOVOS CENÁRIOS POLÍTICOS, caso se consolide essa NOVA MAIORIA, NA FORJA, incluindo a bancada parlamentar do PRS.
De certa forma, será impossível que venham a reclamar tratar-se de uma injustiça em relação ao voto expresso nas urnas, pois O SENTIMENTO GENERALIZADO, EM RELAÇÃO À PRESENTE CRISE POLÍTICA, IMPUTA GRAVES RESPONSABILIDADES AO PAIGC, partido que, em caso de convocação de novas eleições, será claramente castigado pelo eleitorado. No caso de a segunda votação, apesar do tempo que o PAIGC quis ilegalmente ganhar na expectativa de inverter a situação a seu favor, se revelar semelhante à primeira, dando origem à queda do Governo, a Presidência, atendendo à nova configuração parlamentar, optará muito provavelmente por convidar o PRS a formar Governo.
A CONFIRMAR-SE ESTE CENÁRIO, aumenta a responsabilidade do PRS, precisamente em termos da desejada estabilidade das instituições, o tema desta minha comunicação. E, fazendo uso da justificação do meu homólogo Presidente Nambeia, aquando do efémero Governo de 48 horas, trata-se de «Salvar a Guiné».
QUE FIGURINO ADOPTAR, entre as várias possibilidades, de forma a garantir a sustentabilidade desse género de proposta e da sua LEGITIMIDADE POLÍTICA, que resulte num reconhecimento positivo por parte da opinião pública, e venha a render ao Partido bom crescimento do número de votos nas próximas eleições?
Na minha perspectiva, um primeiro requisito prende-se com a UNIDADE DO PARTIDO, principal valor neste contexto conturbado. Dirijo-me em especial aos senhores e senhoras deputadas deste Partido: caso o PAIGC consiga, como parece apostado, quebrar a vossa coesão (à sua imagem), criando casos de dissidência a seu favor, entre os deputados da bancada parlamentar do PRS, voltará tudo à ESTACA ZERO. Pergunto-me: valerá a pena trocar, por vantagens meramente pontuais, o futuro do país e a unidade do Partido, vendendo consciência e dignidade, sabendo que não passam de meros instrumentos de subversão, a descartar na primeira oportunidade?
Outro ponto a ponderar, por parte do PRS, tem a ver com as já referidas reticências, que muita gente alimenta, relativamente a uma GOVERNAÇÃO EXCLUSIVAMENTE PRS. O PRS arrisca-se a cair numa rede de intrigas semelhante ao PAIGC, com os seus militantes a digladiarem-se, de forma interesseira, por lugares governativos, para os quais podem não estar preparados, e os quais se arriscam a ser sol de pouca dura.
Pelo contrário, uma bofetada sem mão, no PAIGC e nos factores de bloqueio do nosso panorama político, seria decerto, na minha opinião, apostar num GOVERNO INCLUSIVO E MULTIPARTIDÁRIO, no qual o MÉRITO se sobrepusesse aos critérios de filiação partidária. Isso, sim, seria uma demonstração de VERDADEIRA INTELIGÊNCIA POLÍTICA, apostando decididamente na CONSOLIDAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES E DA ESTABILIDADE GOVERNATIVA. Por incrível que possa parecer esta tese, ao ceder o poder, o PRS estaria a conservá-lo a prazo, dando provas, ao mesmo tempo, de uma atitude histórica de grande patriotismo.
Se continuarmos a nos alhear de opções que configuram simples bom senso (e a esse título seriam decerto largamente sufragadas pela população), não antevejo grande futuro para a simples existência do nosso país, cuja independência e soberania alguns ousam mesmo sugerir entregar à ONU, naquilo que parece um ATESTADO DE MENORIDADE OU DE INCOMPETÊNCIA, passado a todos e todas nós, guineenses.
Sem querer fazer futurologia, ou prejudicar as opções do PRS face a esta nova fase da sua existência, desejo a todos e todas militantes, em nome do PUSD, um FELIZ ANIVERSÁRIO, recomendando a MÁXIMA PRUDÊNCIA e REDOBRADO SENTIDO DE RESPONSABILIDADE na abordagem destas questões críticas.
Não basta a CAPACIDADE, é igualmente necessária COMPETÊNCIA e CONSISTÊNCIA de resultados, uma abordagem de grande RESPONSABILIDADE e RIGOR, de forma a garantir a necessária ORDEM e ORGANIZAÇÃO, que nos permita reerguer o nosso país aos olhos do mundo e encher de orgulho nossos filhos e filhas.
Disponham da boa vontade do PUSD e da sua Presidente, se decidirem enveredar por um CAMINHO JUSTO, ASSERTIVO E POSITIVO, para levantar do chão a nossa amada Guiné-Bissau.
Pa lantanda nô terra…!
Viva PRS! Viva PUSD!
Subscrever:
Mensagens (Atom)