quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Nota de Pesar

Estávamos em 2008.

Os chineses não queriam aceitar o terreno disponibilizado para a construção do Palácio da Justiça. Diziam, e com razão, que era pequeno e não permitiria construções de posterior alargamento; que era muito baixo e desnivelado, logo iria precisar de muito aterro; que estava ao lado de um Banco e junto de um Hospital (o Militar) e não seria adequado construir um Palácio da Justiça nessas proximidades; ademais, acrescentavam, o ideal seria que o edifício do órgão judicial se enquadrasse nas proximidades do Palácio do Governo, cujas obras já se haviam iniciado.

Era domingo. Dirigi-me a uma zona junto ao QG, para importunar o descanso do PM, que se encontrava em convívio com os amigos. Anunciei-me e, em jeito de SOS, disse: «_Preciso de ver Abel Incada, é um assunto urgente. Preciso de um terreno dele, pois os chineses, a equipa técnica, chegam na 3.ª feira e tenho que ter uma resposta.» Poucos minutos depois, chegou Abel Incada. Homem altíssimo, comerciante, Conselheiro do PM e dono do terreno implorado. Numa situação um pouco caricata, a um canto e fora do convívio promovido pelo PM, Abel Incada ouviu atentamente a minha súplica: «É para o Estado e para a nossa Justiça! Não temos infra-estruturas!» Depois de praguejar um pouco, ficou pensativo e, mais para me acalmar, finalmente falou, de forma muito serena: «_É muita diferença. Tinha projectado construir um hotel nesse terreno. Mas deixa-me pensar, amanhã digo qualquer coisa.» Quase não dormi nessa noite.

Pouco passava das 9 da manhã quando Abel Incada me entra pelo Ministério adentro e me atira à queima-roupa:

- Fique com o terreno.
- Contrapartidas? – disparei, de forma igualmente curta e objectiva.
- Nenhuma. Permuta. Troca por troca, pelo terreno desprezado – respondeu.

Assim foi… Obrigada por mim e por todos nós.

Pudessem todos os políticos sentir o apelo do interesse público e nacional.

Descansa em paz, Abel Incada.

Carmelita Pires, ex-Ministra da Justiça e Presidente do PUSD

domingo, 25 de setembro de 2016

Setembro Vitorioso

De derrota em derrota, quando vemos o país eternamente adiado, como podemos cantar com a mesma alegria que em 1973 e 1974?

O que terá corrompido o nosso glorioso «Setembro Vitorioso»?

Muitas coisas…

Como por exemplo, a repetição dos mesmos erros, vezes sem conta. O povo começa agora a aperceber-se que não são simples «erros» mas antes todo um sistema, cujo objectivo é precisamente sujeitar a sociedade à mediocridade, à miséria, parasitando todas as instâncias de poder político, até ao esqueleto nacional de um NÃO ESTADO.

Como por exemplo, continuar na senda da INCLUSÃO GOVERNAMENTAL, expediente inaugurado no pós-guerra civil e que sempre acarretou maus resultados, apenas favorecendo um cliché para estrangeiro ver, e nunca o Estado ou a população.

Como por exemplo, alimentar a hipocrisia, FINGIR DIÁLOGO, quando este não existe.

Como por exemplo, manter o Estado refém de mecanismos de enriquecimento ilegítimo, elevando ao rubro os INTERESSES PARTICULARES e conservando na governação pessoas impreparadas, quer do ponto de vista da capacidade e da competência, quer da idoneidade e da moral, tudo isto apenas na base desses mesmos interesses. Dando assim péssimos exemplos de corrupção, ostentação e delapidação de fortunas do erário público, em proveito próprio.

Como por exemplo, na actual conjuntura do país e num crescendo de DEMAGOGIA POPULISTA, abusar da memória de Amílcar Cabral, quando o actual Partido, e os seus dirigentes, representam a perfeita antítese dos ideais por este defendidos.

Celebrar, comemorar e homenagear? Hoje? NÃO!

Porquê?

Estamos no séc. XXI e estamos num dos PAÍSES MAIS POBRES do mundo, apesar de uma fachada marítima incrivelmente fértil, tal como o são igualmente as terras de aluvião, logo além do tarrafe.

Mas a «Independência» reverteu-se na DEPENDÊNCIA POLÍTICA E ECONÓMICA: chegámos ao ponto de ver a CEDEAO, o Conselho de Segurança da ONU, os «parceiros de desenvolvimento», a cozinhar uma solução política; as instituições da Bretton Woods, a UEMOA e, uma vez mais, os «parceiros de desenvolvimento», a abanar com dinheiro (que, a seguirmos pelo mesmo caminho, se realmente esse dinheiro vier, logo se perderá pelos mesmos meandros); enquanto o Estado, continua a não possuir nem solução política nem, muito menos, qualquer visão económica, que dê consistência a uma política de crescimento e desenvolvimento sustentável.

O poder judicial continua reconhecidamente INOPERANTE E CADUCO, senão mesmo corrupto, conforme os diagnósticos elaborados ao longo do tempo no Ministério da Justiça (e a opinião do Presidente da República, publicamente partilhada), não apenas com Carmelita Pires como titular, mas também quando esta pasta esteve sob a tutela de Djaló Pires, contribuindo para uma percepção de ausência de imparcialidade e de impunidade.

Não havendo perspectivas para o Estado a curto prazo, no âmbito de uma gestão pontual, prevalecerá sempre tendencialmente a LUTA DESMEDIDA PELO PODER e pela sua manutenção, o nepotismo, a clientela, a falta de escrúpulos, o despesismo, a mediocridade, a inércia, a inveja, a não responsabilização, a péssima produtividade, entre mil outras coisas más, que estarão a reforçar a maldita sina que se parece ter apropriado deste nosso país.

Celebrar e comemorar, homenagear? Daqui a uns anos, talvez. Porquê?

Porque continuamos OPTIMISTAS E PRESERVERANTES. Quando?

Quando o Estado recuperar a sua CREDIBILIDADE e for institucionalmente reabilitado, dando passos significativos na consolidação do sistema de governação, no combate à corrupção e à impunidade.

Quando estiver definitivamente estabilizado o fornecimento normal da ELECTRICIDADE E DE ÁGUA.

Quando já não houver SALÁRIOS EM ATRASO e estes forem reajustados ao nível da sub-região.

Quando se encetar o PROGRAMA DE MODERNIZAÇÃO do sector de Defesa e Segurança.

Quando o COMBATE AO ANALFABETISMO registar sucessos significativos, e passarmos a desenvolver conteúdos culturais nacionais.

Quando os hospitais estiverem apetrechados com recursos humanos minimamente qualificados e com materiais e equipamentos indispensáveis para o seu funcionamento e a SALVAGUARDA DA VIDA humana, que para um tratamento simples não seja necessário ir a Dakar ou a Lisboa.

Quando os IDH (Índices de Desenvolvimento Humano) derem um bom pulo, teremos então um bom pretexto e uma boa razão para comemorar.

Até lá, não podemos falar em «VITÓRIA», pois assemelha-se mais a «VERGONHA».

Mas continuo a acreditar que muitos de nós, antes de morrer, ainda iremos, POR DIREITO PRÓPRIO, celebrar esse famoso «Setembro Vitorioso», que para já, não passa de uma miragem.

quinta-feira, 9 de junho de 2016

Datas Esquecidas

Já lá vão 18 anos desde o 7 de Junho de 1998.

Por causa da guerra e no ano da guerra, muitos despertámos para a política. Juntávamo-nos em Lisboa sob a senda da Justiça com J grande. Éramos muitos guineenses e amigos portugueses da Guiné-Bissau. Todos preocupados com o país. Em comprometimento patriota, reuníamos normalmente no Holiday Inn. Tínhamos reuniões diárias, ou quase. Até nos dávamos ao luxo de enviar textos à Junta em Abidjan. Tenho as fotos que ilustram os espíritos. Fazíamos conferências públicas. Infelizmente, outros já não estão entre nós: o saudoso Pepito e o Adriano!

Acabo de percorrer o interior do país «de lés a lés». Onde a população, aos meus olhos, está entregue à sua sorte e a viver, ou pior, sobrevivendo, em localidades onde o Estado mais não é do que uma miragem.

Os últimos dados estatísticos (INE, 2014) dizem que somos 365.097 em Bissau. No entanto, existem 1.149.354 de pessoas no interior do país.

A Guiné-Bissau é de DATAS ESQUECIDAS!

Estamos como estamos: aguardando os barricados, o governo empossado, os polícias, os juízes, os bloguistas, etc. etc. Sem mais! Enquanto a CI continua complacente, num país fortemente dependente da ajuda externa, porque lê e estuda a nossa história, as nossas pessoas e afinidades, os indivíduos e interesses, os factos e feitos recentes, observando-nos no agora. Nós que aguardamos que os da sub-região apareçam, de novo, para paternalmente nos ajudarem a caminhar na terra fértil e promissora que Amílcar Cabral ofereceu para nossos próprios pés.

O fatídico 7 de Junho, que dizimou almas cujo número, por este andar, nunca se saberá, pouco interessa à história política e sobretudo à recente. Tudo: «Pa i bai suma mon di sal na iagu!». Ademais, é matéria desagradável e imediatamente se torna censurável a pessoa que tenha a desfaçatez de trazer o assunto à colação.

Para que foi tudo isso? Para estarmos assim? Ou seja: instabilidade política crónica, taxa de analfabetismo de 49,8%, em que 69% da população vive com menos de 2 dólares, só 10% da população possui água canalizada, classificados no 177.º no lugar Índice de Desenvolvimento Humano e com a esperança de vida de 54 anos de idade.

Por isso resolvi partilhar o vídeo abaixo e os que seguem. Porque devemos reflectir no FUTURO COLECTIVO, nos nossos filhos e nossos netos.

A revolta dos mais velhos

Carmelita Pires

sábado, 28 de maio de 2016

Reserva moral: Precisa-se


Chove torrencialmente em Bissau. A primeira chuva entra pelo tecto do quarto e molha-me o colchão, mais uma vez. Mesmo assim, porque estamos acostumados, ouvindo o discurso do novo PM em acto de posse, reflicto…!

Tínhamos um PR, uma ANP e um PM, todos do PAIGC. Tudo CONSTITUCIONAL, LEGAL E SOBERANO: ‟Mon na Lama” e ‟Terra Ranka”!

Perante as evidências, contivemos a impaciência, perante mais uma guerra aberta, do salve-se quem "poder", porque, essa guerra, NÃO ERA A NOSSA.

Aqui e hoje, deixo claro que, sendo o PUSD partido sem representação parlamentar, recusamos deitar mais lenha na fogueira e manifestamos, nesta crise e a quem de direito, o nosso compromisso, voluntarismo e disponibilidade, para trabalhar numa SOLUÇÃO SUSTENTÁVEL E DURADOURA para a Guiné-Bissau, o nosso país. Algo claro e em jeito de PACTO NACIONAL.

Todavia, nas reviravoltas, nesta NOVA ÉPOCA, sabemos que toda a anterior história de INCLUSÃO E ESTABILIDADE começou a desmoronar-se com as denúncias públicas de actos de suspeição de corrupção/não transparência/impunidade, versus a luta pelo controlo do dito Estado e dos seus recursos. Este o CENÁRIO DÉMODÉ que, em tempos, nos levou a uma GUERRA CITADINA e ao qual, neste séc. XXI, se acrescenta: os interesses políticos, os financeiros, os partidários, os do sistema e do status quo, os dos clãs, os de parentesco, os de identidade étnica e religiosa e, ainda, os dos capangas contratados (Atenção: nem tudo o que parece é. Particularmente nas personagens deste Facebook, outras redes sociais e blogues). Temos assistido a isto, SEMPRE. Tudo versus o INTERESSE NACIONAL.

Entretanto, nesta DEMOCRACIA do hoje, saiu-nos o seguinte:
1) Um PR com ficha de indiciação criminal, limpa pelo PAIGC;
2) Um PR que publicamente indicia a existência corrupção ao alto nível e em dois poderes do Estado, o judicial e o governativo, com indiciação criminal e pública de membros do Governo, alguns com processos anteriormente pendentes;
3) A mistificação total do Estado: IRÃS E MOUROS (Perguntem-me!);
4) O pedido pelo Governo de DEBATE SOBRE A JUSTIÇA, imediatamente cancelado;
5) A demissão pelo PR do IX Governo Constitucional (argumento principal: CORRUPÇÃO);
6) A incessante GUERRA INTERNA NO PAIGC (a cúpula, o PR e suas alianças, os 15, os Combatentes da Liberdade da Pátria, e mais facções, nomeadamente de Cacheu) e a PGR como arma de arremesso;
7) Apesar de uma NOVA MAIORIA PARLAMENTAR, inviabilizaram os trabalhos na ANP, e agora barricam-se nos seus Gabinetes.
8) A JUDICIALIZAÇÃO DA VIDA POLÍTICA, com providências judiciais, sentenças e acórdãos;
9) Uma sintomática BIPOLARIZAÇÃO POLÍTICA, enquanto os mini-partidos, com representação ou sem representação, num Deus nos acuda de posicionamentos (alguns suspeitos) das suas ditas lideranças, para todos assistirmos e ouvirmos: ora com o PAIGC, ora com PR, ora com os 15 e ora com eles próprios – se atentos verificamos isso e, como sempre, sobra algo para eles nos habituais períodos de excepção constitucional e, naturalmente o RABA-RABATA;
10) A sociedade civil ‟independente”, no descalabro, a nadar nestas ondas de sobrevivência;
11) A adaptação informal da Constituição da República aos interesses partidários e em vozes sonantes, para dizer que o outro não cumpre e, então, não cumprirmos;
12) O desespero registável da 2.ª força partidária (Com que linhas tecer? Mindjor na és!);
13) Numa mesma legislatura, a nomeação do 3.º Vice do bendito PAIGC, de novo e em retorno, como o 4.º PM da legislatura, o tal expulso/não expulsado do seu partido, que dizem sem perfil, sem competência, sem capacidade e, claro, sem saber se conseguirá o necessário sustentáculo partidário (Veremos!).

Nesta sexta-feira, nas minhas reflexões, chego ao N.º 13 que pode ser AZAR (6.ª 13), mas há quem o veja como SORTE. Que seja bom presságio!

Bom, não obstante a tiragem da sorte, uma evidência do relato é que NESTAS COISAS NINGUÉM GANHA. Enganados estão os principais autores do puzzle, que têm filhos e talvez netos. QUEM PERDE É POVO E A GUINÉ-BISSAU: NÓS, a maioria, onde os tais amanhã estarão incluídos. NÓS que aguardamos, sem equipas de facto, levados ao ostracismo, alguns com sapiência e conhecedores das histórias. Pois, no prejuízo da crise, tudo vimos e sabemos. Só nos falta enterrar os vivos!

Questionamos: Quem nos acudirá? Já que somos incapazes, com provas dadas de incapacidade perante a comunidade internacional, a sub-região e os nossos parceiros, todos eles desalentados por NÓS.

Que exasperação perante a história e percurso recente deste PAIGC, que não deixa de ser NOSSO LIBERTADOR!

Com alguma propriedade (filha da Guiné) que aos outros e muitos também assiste, para os 36 mil e poucos km² e a nossa pouca população, lanço o CONCURSO REVOLUCIONÁRIO:

PRECISA-SE DE RESERVA MORAL: 13 patriotas, idóneos/as, com visão de desenvolvimento, conhecedores da nossa realidade, capazes e competentes na sua área, dispostos e disponíveis para se juntarem em prol do bem-comum, sem pejo pelo poder, que queiram trabalhar e muito para o bem comum, SACRIFICANDO-SE, contra o sistema e o status quo e nos termos do art.º 2, n.º 2 da Constituição da República (‟ O povo exerce o poder político DIRECTAMENTE ou através …”). O desafio: REFORMULAÇÃO DO ESTADO. Senão, vamos ter que SALDAR o nosso país!

E, para concluir, em DEMOCRACIA, que ninguém se atreva a dar mais um único tiro, qualquer que seja a razão, no TCHON DI CABRAL.

A Presidente,

Carmelita Pires

sábado, 21 de maio de 2016

Desmentido

Fernanda, uma militante do PUSD, alertou-nos para a utilização que está maliciosa e abusivamente a ser feita do nome do Partido, nas Rádios e outros meios de comunicação social, associando este ao PAIGC e a um grupo de outros partidos na sua órbita, no contexto da organização de manifestações contra o Presidente da República.

Vimos por este meio esclarecer que o PUSD é completamente alheio a estas convocações, que não foi contactado nem participou de quaisquer decisões nesse sentido, estranhando tais manobras e reservando-se o direito de agir em consequência contra os autores desta usurpação grave da nossa identidade jurídica colectiva.

Mais relembramos que o PUSD tem pautado o seu posicionamento pelo não alinhamento neste imbróglio político a que a irresponsabilidade do PAIGC tem conduzido o país. Uma postura de equidistância e de imparcialidade que não nos impede de registar a falta de respeito pelas regras de sã convivência democrática.

Recomendamos ainda aos guineenses para não se deixarem manipular por estas manobras de propaganda desonestas, que apenas servem para colocar a nu o desespero dos seus comanditários, face à sua manifesta falta de soluções e de capacidade para o diálogo, numa postura de bloqueio constitucional que pretendem imputar a outrem.

O PUSD, nesta crise política que assola o país, nunca deixou de se manifestar pelo diálogo, pela transparência, por uma solução governativa duradoura e sutentável. O PUSD defende Competência, Capacidade e Consistência; Ordem e Organização; Responsabilidade e Rigor; com estas regras, estará sempre disponível.

Contra a banalização da política!
Pela moralização da vida pública!

Contra a crispação parlamentar!
Pela pacificação social!